domingo, 24 de março de 2013

TEM QUE OUVIR: Johnny Winter - Still Alive And Well (1973)

Serei sucinto: quando o assunto é blues rock, Johnny Winter é quem dá as cartas. Eu sei, Cream e ZZ Top quebram tudo, mas escute Still Alive And Well e admire o mais alto degrau que a guitarra pode alcançar dentro do estilo.


O álbum foi o primeiro a ser gravado após o lendário albino livrar-se (temporariamente) das drogas. Isso explica sua voz impecável e execução primorosa na guitarra, que fez dele um dos grandes ícones do instrumento.

As duas faixas que abrem o disco, "Rock Me Baby" e Can't You Feel It", são extremamente vigorosas, apresentando frases recheadas de bends, capazes de enlouquecer os fãs de blues e rock setentista. Sua aula de guitarra se prolonga por todo o álbum, vide o slide matador na fantástica "Rock & Roll" e pesado riff de "All Tore Down".

Johnny Winter debulha em "From A Buick 6" (Bob Dylan), que ganhou aqui uma versão energética. Outra regravação que chama atenção é "Let It Bleed" dos Rolling Stones. Alias, a dupla Jagger/Richards chegou até mesmo a ceder uma composição exclusivamente para Winter, falo da ótima "Silver Train". 

Mas nem só de petardos é feito o álbum, vide a maravilhosa "Cheap Tequila", uma das grandes baladas do rock.

Dentre tantos talentosos músicos envolvidos neste trabalho estão Rick Derringer (parceiro de Edgar, irmão de Johnny Winter), o pianista Moogy Klingman (que tocou na banda Utopia, do Todd Rundgren), além dos próprios Edgar Winter e Todd Rundgren.

Esse é um dos grandes álbuns da história da guitarra blues, curiosamente tocado por um branquelo albino e vesgo.

sexta-feira, 22 de março de 2013

5 motivos para não perder o dia 30/03 do Lollapalooza

Antes de tudo é preciso fazer um adendo importante, ainda que óbvio: o Lollapalooza não está me pagando para falar sobre o festival. Todas as opiniões aqui postadas são pessoais.

Após deixar isso esclarecido, serei direito ao dizer que você não pode perder os shows do dia 30/03 no Lollapalooza. Por que? Pelo simples motivo de que raramente no Brasil temos a oportunidade de ver bandas tão distintas no auge da criatividade e do sucesso.

Sem mais delongas, vamos conhecer um pouco das bandas que me fizeram comprar o ingresso para o festival.

01 - Tomahawk
Talvez esse seja o projeto mais normal do Mike Patton, por mais incrível que isso possa parecer. O mais legal de assistir a um show dele é o fato de não saber o que ele fará no palco. Em tempos de bandas perfeitamente ensaiadas, isso chega a ser uma injeção de combustível. Completam a formação os também talentosos Duane Denison (The Jesus Lizard), John Stanier (Helmet e Battles) e Kevin Rutmanis (Cows e Melvins)

02 - Alabama Shakes
Um dos mais comentados grupos da atualidade. Fazem uma mistura bombástica de Southern Rock com Soul Music, sempre com uma sonoridade revival, seja pelas composições, seja pelos timbres. Boys & Girls, disco de estréia da banda lançado em 2012, foi um grandes trabalhos do ano passado. Foram raras as vezes que uma banda ainda antes de estourar por completo tocou no Brasil. Vai ser showzão!

03 - Gary Clark Jr.
Possivelmente o maior nome da guitarra Blues atual. Tem feito um sucesso considerável nos EUA, tocando em praticamente todos os grandes festivais. Entre os guitarristas veteranos é sempre elogiado, principalmente pelo Eric Clapton (vale lembrar que ele abriu shows do Clapton em sua última passagem pelo Brasil, além de sempre tocar no festival Crossroads). Recentemente deu uma canja com os Rolling Stones no show comemorativo dos 50 anos da banda, além de ter feito uma apresentação na Casa Branca para o presidente Obama e seus convidados. Ou seja, o cara tá em alta, tocando muito e com muito gás pra queimar.

04 - Queens Of The Stone Age
A banda liderada pelo grande Josh Homme já tornou-se mítica. Eles popularizaram o Stoner Rock e fizeram os grandes discos de Rock dos últimos 15 anos. Ao vivo, creio eu (nunca assisti), que a coisa deve ser ainda mais energética. Obs: Dave Grohl, eterno baterista do Nirvana e líder do Foo Fighters, é quem está gravando o disco ainda inédito do QOTSA. Ainda que pouco provável, não duvido que ele apareça em cima do palco com a banda. Resta aguardar.

05 - The Black Keys
Uma das melhores banda de Rock da atualidade e sem dúvida a mais comentada. O ultimo disco do duo, El Camino (2011), já é quase um clássico. Seria um show perfeito para um local pequeno, mas com a popularidade em alta, colocarão não menos que 60 mil pessoas para pularem ao som de suas ótimas músicas.

O som dessas bandas citadas acima não te convenceu a "perder" seu sábado no mega festival? Se liguem em mais algumas bandas/artistas que tocam no mesmo dia: Frank Ferdinand, A Perfect Circle, Nas, Criolo, Graforréia Xilarmônica, dentre outros. Tem que ir!

quinta-feira, 21 de março de 2013

TEM QUE OUVIR: Som Imaginário - Matança do Porco (1973)

Quando se fala em supergrupos, conjuntos brasileiros acabam criminalmente esquecidos dentro do inconsciente formado por medalhões internacionais. Isso torna-se extremamente agravante quando pensamos no maravilhoso Som Imaginário, banda espetacular que acompanhou diversos artistas, dentre eles Milton Nascimento e Gal Costa. Formado por músicos lendários, a banda lançou em 1973 um dos grandes registros da música instrumental brasileira, falo do cultuado Matança do Porco.


"Armina", faixa que abre o disco, tem um dos temas mais bonitos da música brasileira. A introdução é construída pela espetacular guitarra coberta de fuzz do Fredera e deságua no sofisticado piano de Wagner Tiso, recheado de referências eruditas, criando climas belos e tensos. A beleza é tanta que a melodia é usada como vinheta várias vezes no decorrer do disco.

Se músicas como "A3" e "A Nº 2" não tem nomes muitos criativos, em contrapartida esbanjam o talento dos integrantes como instrumentista e compositores, flertando primorosamente o rock progressivo e o jazz com a música brasileira, principalmente a bossa nova, o samba e a música mineira. 

Além dos já citados Wagner Tiso e Fredera, outro fabuloso músico presente no disco é o baterista Robertinho Silva. É possível conferir sua ótima performance na longa "A Matança do Porco", um puro jazz rock, com grande solo guitarra e final apoteótico de coral comandado por Milton Nascimento. Já o baixista Luiz Alvez e o violonista Tavito se destacam no regionalismo da ótima "Bolero".

Esse grande disco do Som Imaginário pode ser considerado a grande obra-prima do fusion nacional, tamanha a riqueza do álbum. Amantes da música brasileira, jazz rock e rock progressivo não podem passar despercebidos por esse grande trabalho.

quarta-feira, 20 de março de 2013

Mortos antes dos famigerados 27 anos

Existe na música, mais especificamente no rock, uma maldição capaz de ter tirado a vida de grandes artistas aos 27 anos. Após a morte do ícone do blues Robert Johnson - recheada de lendas envolvendo um bizarro pacto com o Diabo, embora provavelmente tenha sido um envenenamento -, outros astros perderam a vida tragicamente com a mesma idade, vide Brian Jones, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, Pigpen, Chris Bell, Kurt Cobain, Richey Edwards e mais recentemente a Amy Winehouse.

Mas o que mais me espanta não é especificamente o número 27, mas sim o grande legado deixado por esses jovens artistas que viveram tão pouco. Pensando nisso, trago ao blog casos ainda mais extremos de músicos que viveram menos e que, ainda assim, tiveram uma carreira produtiva. Sem mais delongas vamos a eles.

Obs: a ideia não é trazer TODOS os músicos que morreram antes dos 27 anos, mas sim os casos mais emblemáticos.

Ritchie Valens - 17 anos
Um dos primeiros artistas que fundiu a música latina com o rock, exemplificado na clássica "La Bamba". O dia da sua prematura morte, causada por um acidente de avião junto de outro grande artista da época (Buddy Holly), abalou tanto a sociedade que foi chamado de "O dia em que a música morreu".

Marcos Alan - 17 anos
Embora tenha tido uma vida curtíssima, Marcos Alan é um dos principais nomes do violão erudito brasileiro, tanto pelo seu trabalho enquanto intérprete quanto como compositor.

Sid Vicious - 21 anos
Um dos maiores personagens do punk rock. Apesar de instrumentista terrível, encarnava a atitude sonora/visual do movimento. Mesmo "tocando" com o baixo desligado em muitas ocasiões e sequer tendo gravado o único registro oficial de estúdio dos Sex Pistols, sua morte prematura, a exemplos de tantos outros casos, elevou a própria lenda.

Eddie Cochran - 21 anos
Guitarrista icônico, dono de visual extremamente copiado, Eddie é um dos arquitetos do rock e um dos mais influentes músicos para o rockabilly, embora tenha vivido apenas 21 anos. Morreu tragicamente num acidente de carro.

Buddy Holly - 22 anos
Um dos mais influentes músicos da fase embrionária do rock. Suas ótimas composições ajudaram a popularizar não só o rock, mas também a guitarra stratocaster. Morreu no mesmo acidente que vitimou Ritchie Valens.

Aaliyah - 22 anos
Cantora importante no desenvolvimento do r&b contemporâneo. Ela chegou a trabalhar com a Missy Elliott e gravar discos solos hoje cultuados. Morreu tragicamente num acidente aéreo.

Dead - 22 anos
O tal vocalista/letrista do Mayhem que estourou os miolos e foi parar morto na capa de um disco.

Ian Curtis - 23 anos
Se as letras depressivas de Ian Curtis já eram fortes por si só, as coisas só pioraram quando ele foi encontrado enforcado. Assim como sua banda, o Joy Division, Ian Curtis virou ídolo de uma geração desmotivada e ícone do pós-punk.

Jimmy Blanton - 23 anos
Um dos grandes nomes da história do baixo, principalmente devido seu trabalho com Duke Ellington. Suas linhas de baixo são pilares do instrumento.

Cliff Burton - 24 anos
Ainda que suas qualidades sejam algumas vezes superestimadas, é inegável que o Cliff Burton era um músico talentoso. Alias, era o arranjador do Metallica, tendo contribuído para as melhores composições do grupo. Além de ter criado grandes melodias, seu timbre de baixo é um dos mais singulares da história do instrumento.

Duane Allman - 24 anos
Possivelmente o mais influente guitarrista slide de todos os tempos. Seu trabalho com a Allman Brothers Band e sua participação no Derek And The Dominos é de outro mundo.

Barry Oakley - 24 anos
Com a mesma idade e poucos metros de onde o Duane Allman morreu, o baixista do Allman Brothers Band também se acidentou. Uma tragédia total.

Notorious BIG - 24 anos / Tupac Shakur - 25 anos
Dois dos maiores nomes do gangsta rap, não somente devido a guerra entre gangues que ocorreu nos EUA até meados da década de 1990, mas principalmente devido as músicas que produziram. Pagaram com suas vidas para construírem o próprio império e legado artístico dentro do hip hop.

Frankie Lymon - 25 anos
Esse cantor foi fundamental para o desenvolvimento do doo-wop e do rock n' roll quando era apenas uma criança. Infelizmente sua carreira entrou em decadência, originando depressão e vícios. 

Scott LaFaro - 25 anos
Um dos mais influentes baixistas da história do jazz, conhecido pelo seu rico trabalho ao lado do Bill Evans Trio.

Charlie Christian - 25 anos
Assim como aqueles poetas que morrem ainda jovens de tuberculose, Charlie Christian sofreu do mesmo mal. Ainda assim teve tempo de ser um dos grandes ícones da guitarra jazz, sendo um dos músicos que popularizou a guitarra elétrica.

Paul Kossoff - 25 anos
Um dos mais selvagens vibratos da guitarra pertencem a Paul Kossoff, cultuado guitarrista do Free. Grande nome da guitarra hard rock da década de 1970.

James Honeyman-Scott - 25 anos
O insano guitarrista do Pretenders era tido como um instrumentista singular. Desde sua longínqua morte em 1982, a banda não encontrou um guitarrista para preencher a altura sua vaga. E olha que Robbie Mcintosh e Johnny Marr passaram pela banda.

Randy Rhoads - 25 anos
Ícone da guitarra heavy metal e um dos grandes nomes do instrumento ao lado de Eddie Van Halen no início da década de 1980. Deixou uma pequena obra, mas ainda assim extremamente influente. Sua morte perfeitamente evitável é das mais absurdas da história do rock.

Tommy Bolin - 25 anos
Esse espetacular guitarrista, apesar de curta carreira, fez trabalhos seminais ao lado do Billy Cobham, James Gang e Deep Purple. Dizem que até mesmo Jeff Beck foi influenciado por ele. Isso dispensa qualquer adjetivo.

Scott La Rock - 25 anos
DJ fundador do Boogie Down Productions. Foi uma das primeiras estrelas do hip hop a morrer devido a guerra entre gangues. Seu trabalho é ainda hoje referência.

Razzle - 25 anos
Baterista da influente banda de glam rock, Hanoi Rocks. Morreu num acidente de carro em que o Vince Neil dirigia alcoolizado, o que gerou problemas legais ao vocalista do Mötley Crüe.

Dave Leonard - 25 anos
Vocalista e fundador do Crashdïet. Um dos últimos personagens que "abalou" a cena hard rock. Sua morte foi típica de um junkie rockstar que caiu em desgraca.

Euronymous - 25 anos
Figura mitológica do black metal norueguês. Fundador da banda Mayhem, além de dono do selo Deathlike Silence. Morreu assassinado pelo Varg Vikernes (Burzum), num nos maiores retratos de extremidade desta cena.

Evaldo Braga - 25 anos
Ótimo cantor brasileiro, negro, que atingiu popularidade com seu ainda hoje hit "Sorria Sorria". Morreu num acidente de carro.

Hillel Slovak - 26 anos
Guitarrista da primeira formação do Red Hot Chili Peppers, responsável por ter gravado os primeiros discos da banda. Sua abordagem musical recheada de funk e rock psicodélico influenciou até mesmo seu substituto, o John Frusciante.

Otis Redding - 26 anos
Um dos maiores cantores de todos os tempos. Timbre maravilho, performances brilhantes, composições excelentes... sem dúvida um dos grandes ícones da soul music. O mais famoso artista da mítica gravadora Stax.

Noel Rosa - 26 anos
Muita confusão se faz sobre a real idade da morte do Noel Rosa, sendo que muitos apostam que ele faleceu aos 26 Anos. Mas o que todos tem certeza é que ele foi um dos grandes compositores da música brasileira.

Nick Drake - 26 anos
Após a morte prematura do tristonho/amargurado Nick Drake, sua poética depressiva fez ainda mais sentido. Não por acaso o culto ao seu trabalho somente vem crescendo com o passar do tempo.

Gram Parsons - 26 Anos
Quem conhece a obra de Gram Parsons, que vai do International Submarine Band, passando pelo Byrds, Flying Burrito Brothers e sua carreira solo, tem dificuldade em pensar que sua vida foi tão curta.

Mamonas Assassinas - três músicos entre 22 e 26 anos
Uma das maiores comoções da música brasileira. Diante de tamanha tragédia, a qualidade artística pouco importa. Um sucesso intenso que durou menos de um ano e deixou como registro um único disco extremamente popular e bem humorado.


*Embora esse post seja originalmente de 2013, infelizmente uma nova leva de jovens artistas morreram, principalmente no cenário do cloud rap, pop rap, emo rap e drill. Dito isso, achei que valeria menciona-los para deixar registrado. São eles:

Pop Smoke - 20 anos

Lil Peep - 21 anos

XXXTENTACION - 20 anos

Juice Wrld - 21 anos

Mac Miller - 26 anos

sábado, 9 de março de 2013

TEM QUE OUVIR: Pixies - Surfer Rosa (1988)

No início da década de 1990, a indústria da música mergulhou de cabeça no rock alternativo de grupos como Nirvana e Smashing Pumpkins. Uma das bandas que originaram a sonoridade suja e destemida desses grupos e ajudou a estruturar o que viria a ser o indie rock foi o Pixies, principalmente com seu disco de estreia, o seminal Surfer Rosa (1988).


Lançado pelo selo 4AD, o trabalho foi produzido pelo lendário Steve Albini, que abusou de técnicas não convencionais de gravação, vide "Gigantic", o ótimo primeiro single do disco, de refrão envolvente devido a interpretação singelamente eufórica da Kim Deal. A construção de guitarra, baixo e bateria também chama atenção numa banda que não tinha nenhum exímio instrumentista.

A maravilhosa/delirante "Where Is My Mind?" foi captada numa casa de banho, originando um reverb cavernoso, trazendo emoção via a engenharia de áudio para o lírica desnorteada. Vale lembrar que posteriormente a canção foi usada no filme Clube da Luta, tornando-a um clássico da banda. 

A sujeira vocal de "Something Against You" é fruto da captação da voz de Black Francis através de um amplificador de guitarra. O resultado é fantástico. Alias, seria essa faixa um "surf-black metal"?

O disco tem um punhado de riffs de guitarra extremamente ruidosos, ótimas melodias vocais, linhas de baixo inteligentes e bateria consistente, como pode ser notado nas imundas "Bone Machine", "Break My Body" e na crueza de "Brick Is Red". Outra característica marcante são as letras enigmáticas, violentas, obscenas e surrealistas, vide "Broken Face", "Cactus" (que som de bateria!) e "River Euphrates".

As referências tanto de punk rock quanto de surf rock ficam nítidas na frenética "Tony's Theme". Já as vozes intercaladas de Black Francis e Kim Deal em "I'm Amazed" formam o elo perfeito entre um grande compositor e uma das mulheres de personalidade mais fortes do rock.

Ainda que o Pixies viesse a se superar no ano seguinte com o maravilhoso Doolittle, o embrião de muito do que surgiu posteriormente no rock alternativo está em Surfer Rosa.

sexta-feira, 8 de março de 2013

A diversidade do rock nacional 90's

Com a morte do Chorão, vocalista/líder/compositor do Charlie Brown Jr., uma questão voltou a chamar minha atenção: o quão rica foi a safra do rock nacional da década de 1990. 

Pensando nisso, venho aqui com doses moderadas de saudosismo (coisa que eu costumo repudiar) relembrar as bandas do período. Perceba como cada grupo se distinguia em atitude, temática e sonoridade, formando assim uma cena rica. Foi demais ter vivido essa fase - embora criança, sem ver os shows -, tendo diariamente assistido tais bandas na MTV e escutado na recém ressuscitada 89 Rádio Rock.

Pra não ficar apenas defendendo o rock do período, acho importante lembrar que a maioria dessas bandas não sobreviveram ao teste do tempo - assim como aconteceu comercialmente com as bandas oitentistas na década de 90 -, o que acabou refletindo no atual cenário musical. Vale lembrar também que, apesar do grande alcance dessas bandas, foi o axé e pagode que dominou os grandes meios de comunicação na década de 1990.

Obs: sequer falarei das espetaculares bandas do cenário alternativo como Little Quail, DeFalla, Pin Ups, Killing Chainsaw, Second Come, Mickey Junkies, Graforréia Xilarmônica, The Dead Billies, Muzzarelas ou Gangrena Gasosa. Vou ficar no mainstream mesmo.

Raimundos
Disparado a banda que mais gostava quando criança. Eles não queriam aprovação de ninguém. Bons modos passavam longe deles. Provavelmente por isso atingiram em cheio a molecada. É verdade que muitas letras não sobreviveram bem, mas elas faziam sentido na época. Tinham na sonoridade uma mistura rica de hardcore, punk rock, metal e... forró. Os dois primeiros discos deles são clássicos do rock nacional. 

Planet Hemp
Se os EUA tinham o Rage Against The Machine, o Brasil tinha o Planet Hemp. Com letras cantadas em forma de rap abordando (ao contrário do que muitos pensam) diversas questões políticas (dentre elas a famigerada legalização da maconha), além de instrumental preciso, o Planet Hemp polemizou e deu ainda mais atitude para sua geração.

Chico Science & Nação Zumbi
Um verdadeiro choque na música brasileira. Chamaram atenção do público jovem, dos veteranos da MPB e da mídia. Misturaram rock com o maracatu, hip hop, psicodelia, funk... fizeram art rock brasileira denominada manguebeat.

Mamonas Assassinas
Descaradamente uma piada sonora, os Mamonas Assassinas tinha bons músicos, um vocalista irreverente e humor ligeiro. Não bastasse tudo isso, como disse certa vez o Régis Tadeu "os Mamonas fizeram muita criança preferir ganhar de presente uma guitarra do que um videogame". Em contrapartida, o sucesso do grupo matou as pequenas cenas, já que eles viraram padrão da indústria. Mas aí também não foi culpa deles.

O Rappa
Longe de estar entre minhas bandas prediletas, O Rappa inicialmente ao menos apresentava consistência em sua mistura de pop rock, reggae, rap, dub e elementos eletrônicos. Isso sem falar no engajamento social. Hoje a banda representa um verdadeiro nada.

Skank
A grande verdade é que o Skank é a melhor banda do pop rock nacional. Eles fazem canções com típica pegada inglesa (de Beatles até Oasis), com doses de reggae e marcas de Clube da Esquina no DNA. Não por acaso seus shows agradam ainda hoje todo tipo de público.

Patu Fu
O Patu Fu é uma banda subestimada. Eles fazem pop rock honesto e tem na liderança o talentoso guitarrista/compositor/produtor John Ulhoa. Não vejo nas banda atuais criatividade, talento e coragem suficiente para fazer uma introdução com theremim (como em "Eu") ou um single cantado em japonês (como em "Made In Japan"). Acho bacana.

Charlie Brown Jr.
Reggae, funk, rap e rock tocado por músicos extremamente competentes e liderados por um vocalista no mínimo carismático. Foi o suficiente para eles conseguirem se comunicar com sua geração. Se esse é o papel da música popular, eles tiveram enorme êxito.

Jota Quest
Se hoje o Jota Quest não demonstra relevância musical, nos anos 90 eles foram ao menos ousados ao apresentar uma mistura de pop rock com funk/soul, ainda mais para cinco branquelos mineiros. Como se já não bastasse regravar "As Dores do Mundo" do Hyldon, eles ainda lançaram como single a ultra swingada "Encontrar Alguém". Destaque para o groove do ótimo baixista PJ. Era pop rasteiro, mas com frescor. Hoje é uma piada de mal gosto.

Sepultura
Desnecessário qualquer comentário. Maior banda brasileira fora do país. Influenciou diversos grupos (do Pantera ao Machine Head, passando pelo Korn e Slipknot). Nada se compara ao Sepultura em termos de peso e energia. Ainda hoje relevante.

Dr. Sin
Acredito que se o Dr. Sin fosse uma banda americana eles seriam do tamanho do Extreme. Ainda assim, no Brasil tornaram-se referência no quesito virtuosidade com musicalidade. Isso sem falar na produção de nível internacional. Não por acaso antes mesmo de lançarem o disco de estreia já estavam dividindo palco com L7, RHCP, Alice In Chains e Nirvana. Pena que chegaram tarde e a febre hard rock já havia passado.

Angra

Uma das bandas mais influentes do power metal/metal melódico, sendo na minha opinião a única interessante do gênero no mundo. Discos como Holy Land e Temple Of Shadows conseguem ser extremamente virtuosos, mas carregados de melodias progressivas e elementos brasileiros. Conseguiram prestigio dentro do heavy metal sem precisar copiar o Sepultura.

terça-feira, 5 de março de 2013

TEM QUE OUVIR: Pink Floyd - The Dark Side Of The Moon (1973)

The Dark Side Of The Moon é tão clássico que dispensa apresentações. Sua emblemática capa - criada pelo lendário Storm Thorgerson -, com um prisma sendo atingido por um feixe de luz, transmite décadas de culto associado a canções aqui presentes. 


Ainda que os integrantes do Pink Floyd não tenham o mesmo grau de virtuosismo - e nem precisam - dos músicos do Yes, Gentle Giant, Genesis e King Crimson, o fato deles lançarem discos conceituais de enorme sucesso os colocou como a banda mais importante do rock progressivo. Falando em sucesso, é sempre interessante lembrar os números impressionantes que o álbum atingiu, vide que o disco ficou 15 anos (!!!) consecutivos entre os 100 mais vendidos da Billboard.

O tema central das músicas do Dark Side são os conflitos existenciais, a começar pela maravilhosa "Breathe", que trata do envelhecimento e da eterna dúvida sobre o sentido da vida. Sua introdução climática deixa tudo ainda mais profundo. O mesmo vale para a clássica/genial "Time", de letra extrema reflexiva, coro vocal oriundo da música gospel e um dos mais belos solos do David Gilmour.

Se a instrumental "On The Run" é de experimentalismo eletrônico, minimalista, cacofônico e esquizofrênico, a delicada harmonia de "The Great Gig In The Sky" traz a linguagem jazzista do subestimado Richard Wright, além do celestial canto de Clare Torry.

É interessante notar que "Money", a faixa mais radiofônica do disco, tem um formato pouco usual: longa duração, inovadores samples de relógios na introdução, compasso em 7/4, solo jazzistico de saxofone - de autoria do Dick Parry - e letra sobre cobiça, que assim como sua intrigante linha de baixo, é de autoria do Roger Waters. Impossível também passar batido diante do solo ultra melódico do David Gilmour. Meio bluesy, meio etéreo.

"Us And Them" é um pop de harmonia sofisticada (mais uma vez mérito do Richard Wright). Já a instrumental "Any Colour You Like" é mais funkeada, com destaque para a bateria segura do Nick Mason.

A maravilhosa dobradinha sobre ganância, loucura - o espírito de Syd Barrett ainda presente? - e insignificância material formada por "Brain Damage" e "Eclipse" fecham esse espetacular álbum de audição obrigatória, que de preferência deve ser escutado não ao mesmo tempo em que se assiste o filme Mágico de Oz. Deixe essa fusão das obras para os chapados. 

As curiosas pérolas da Casa Edison

"Hino Nacional, executado pela banda da Casa Edison, Rua do Ouvidor 107".


Se tem algo que eu admiro é o papel da música enquanto expressão popular. Infelizmente, antes da criação dos fonógrafos (inventado por Thomas Edison), que permitiu a gravação/documentação das composições, muito da música popular foi perdida no tempo. Afinal, poucos eram os que tinham conhecimento erudito para escreverem suas músicas em partituras. O pouco que conhecemos foi através da sobrevivência oral/hereditária.

No Brasil, essa documentação (e comércio, claro) começou em 1900, com a fundação da Casa Edison, uma gravadora responsável pelos primeiros registros no Brasil. Por usarem cilindros fonográficos, as captações são de qualidade arcaica, ainda assim trazendo um charme interessante para os dias de hoje, além de imensurável valor histórico.

É importante lembrar que a Casa Edison foi durante muito tempo representante da gravadora Odeon, o que tornou seu selo bastante especial. A gravadora funcionou até 1932.

Sem mais papo histórico, vamos ouvir um pouco dessas curiosas pérolas da Casa Edison.

Baiano - Isto é Bom (Xisto Bahia)
Começar do começo. Primeira gravação da Casa Edison, logo, primeira gravação do Brasil. Como diz na própria chamada antes da canção, é um lundu, gênero de dança de matriz africana. 

Baiano - Pelo Telefone (Donga e Mauro de Almeida)
Tido como o primeiro samba de todos os tempos (apesar da célula rítmica de maxixe), essa é uma das composições feitas na lendária casa da Tia Ciata, o templo inicial do samba. Canção e gravação não menos que histórica, mais uma vez interpretada pelo Baiano.

Rato Rato (Claudio Manoel da Costa)
Uma polca engraçadíssima, principalmente pela interpretação. É interessante observar o quanto que o cantor tinha que gritar para que o fonógrafo conseguisse captar sua voz sem que fosse encoberta pelos outros instrumentos. Essa limitação tecnológica é dissociável de como as músicas eram interpretadas, tanto em energia, quanto em clareza de dicção. O desenvolvimento da canção popular brasileira passa por essa questão.

Mario Pinheiro - Boceta de Rapé
A prova definitiva que a música brasileira sempre teve o humor, o duplo sentido e até mesmo a sacanagem inserida no seu contexto. Isso quase um século antes do funk carioca.

Vicente Celestino - Flor do Mal
Durante muito tempo, Vicente Celestino foi o maior cantor do Brasil, não só em popularidade (vide o sucesso de "O Ébrio"), mas também tecnicamente, visto que ele se apoderou das limitações técnicas das gravações mecânicas, lapidando a força do modo de cantar com expressividade, elegância, afinação e timbre primoroso.