quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

TEM QUE OUVIR: Tame Impala - Lonerism (2012)

Ao retratar musicalmente uma época, é comum se deparar com obras pessoalmente nem tão impactantes, embora fundamentais numa visão macro. Eu coloco o Lonerism (2012) do Tame Impala sob essa perspectiva.


Esse foi o segundo álbum do grupo liderado pelo Kevin Parker. O disco trouxe holofotes para uma efervescente cena psicodélica australiana. A partir daí o rótulo neo-psicodélico tornou-se recorrente.

Longe de querer me gabar por algo tão besta, mas na época em que o disco foi lançado, além de eu já ter vivido experiências alucinógenas, eu também já havia passado por toda a árvore genealógico-temporal do rock psicodélico - Moby Grape e Love, Happy Mondays e Stone Roses, Flaming Lips e Spiritualized -, sendo facilmente aquela (a minha) geração a que menos me interessou. Na verdade, outros grupos contemporâneos ao Tame Impala que investiam no mesmo gênero chamaram mais a minha atenção, vide o Deerhunter e o King Gizzard & The Lizard Wizard, esse último também australiano.

Mas não há dúvida do porquê o Tame Impala ter se tornado tão grande. É que por trás daqueles equipamentos vintages, timbres retrô, letras delirantes e projeções visuais lisérgicas, havia também um apelo pop. E se antes eu via isso com demérito, hoje me soa perspicaz.

A primeira música que tomei contato com a banda foi a ótima "Elephant", dona de um riff quase stoner, mas que soa como o que aconteceria se o John Lennon desse uma canja com o Pink Floyd na fase Syd Barrett. Combinação melhor não há.

Com seu baixo opaco, balanço sexy e timbres cósmicos, "Feels Like We Only Go Backwards" fez bastante sucesso, trazendo ao grupo um novo público indie. Dito isso, é curioso como "Why Won't They Talk To Me?" soa como se o Strokes tomasse LSD.

Mas é o delírio quase krautrock de "Be Above It" que abre o álbum, com suas precursões tribais, radiantes e saturadas. Atenção para o uso dos sintetizadores, algo que viria a se tornar uma marca futura da banda.

O som enorme da linda "Endord Toi" parece emular um reverb do espaço. Os ótimos teclados preparam o terreno para os excelentes versos. Há também exuberantes guitarras carregadas de fuzz no final da canção. É inevitável não pensar do Flaming Lips diante desta produção.

É interessante como "Apocalypse Dream" consegue soar tão sessentista (à la Beatles) quanto contemporânea. A composição tem um colorido especial. O mesmo vale para a acanhosamente pulsante "Mind Mischied", de baixo e bateria inquietos. Seu final é majestoso.

O astral elevado de "Music To Walk Home By" revigora as energias. É o flerte perfeito do pop com a psicodelia. Mais uma vez há timbres borbulhantes que trazem uma luz espacial. Atenção também para as elaboradas dobras vocais.

Se no inicio "Keep On Lying" é empurrada com a barriga, no final há uma construção cacofônica bem interessante.

No desfecho do álbum está a magnifica "Nothing That Has Happened So Far Has Been Anything We Could Control", onde os sons processados trazem uma riqueza de texturas. Tudo em cima de um looping de bateria sensacional que dá a sensação de "jam de um homem só". Embora eu não seja entusiasta desta voz aguda do Parker, aqui ela funciona. O final da faixa é bem experimental.

Artista altamente requisitado - seja pelo Mark Ranson, Lady Gaga, Kanye West ou Travis Scott - Kevin Parker tornou-se um dos grandes nomes do rock desta última década. Já o som psicodélico do grupo transcendeu o nicho alternativo e virou música de "publicitário descolado". Tudo bem, todos tem direito de ganhar dinheiro. Mas a verdade é que após o Lonerism, a veia pop do Tame Impala foi cada vez se acentuando mais e soando menos interessante para mim, sendo disparado este álbum o melhor retrato do talento do Kevin Parker.

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