TEM QUE OUVIR: The Meters - Look-Ka Py Py (1969)

A cultura musical de New Orleans é conhecidamente diferenciada e especial. Lá o jazz, funk e blues tomam particularidades oriundas da população de origem africana ali presente. No alicerce dessa construção musical está o The Meters, que além de ter servido como banda de apoio para ícones locais - vide Allen Toussaint e Dr. John -, desenvolveu luz própria através de um trabalho primoroso, vide o clássico Look-Ka Py Py (1969).

Vindo de um hit - a emblemática "Cissy Strut" -, esse disco nasce já com o aval na produção do Allen Toussaint.

A banda é formada por Art Neville (teclados/órgãos), George Porter Jr. (baixo), Leo Nocentelli (guitarra) e Ziggy Modeliste (bateria), quatro monstros de seus respectivos instrumentos, ao ponto que evitarei rasgação de seda nominal para não ser redundante no texto. Mas que fique claro: eles são absurdos!

"Look-Ka Py Py" abre o disco. É um clássico da maior estatura do funk. Seu momento vocal nos primeiros dois compassos já canta a bola pro groove certeiro que vem a seguir. Groove esse levado por um riff de guitarra e baixo altamente fixante.

Toda vez que ouço "Rigor Mortis" fico pensando em quantos beatmakers não gostariam ter feito essa base e quantos MC's não adorariam cantar em cima desse beat. Inclusive, esse órgão já foi emulado pelos Beastie Boys em alguns momentos.

"Pungee" tem um balanço relaxado, ritmicamente acentuado por uma cozinha ultra inspirada. Tremenda performance de baixo e bateria. O mesmo vale para chacoalhante "Yeah You're Right".

Aposto um beignets que o Otis Redding dispensaria o Booker T. & The M.G.'s se pudesse cantar em cima do instrumental de "This Is My Last Affair".

A pegada que o grupo transparece em "Funky Miracle" é avassaladora. Parece uma típica levada que o Led Zeppelin sonharia em produzir, mas jamais conseguiria. Aqui vale atentar para a captação calorosa da gravação.

É adorável perceber como os quatro constroem os ritmos altamente complexos e grooveados, vide a fantástica "Little Old Money Marker", onde cada um responde ao espaço deixado pelo outro com levadas certeiras. Pra completar, há ainda ótimos solos.

Como é possível swingar com tamanha convicção e tranquilidade num ritmo relativamente lento como o de "The Mob"? Parece bruxaria.

Esse disco é uma avalanche de ritmos, levadas e performances das mais brilhantes da música popular. Isso vindo de apenas quatro músicos em estúdio num clima de jam e em perfeita sintonia. É magia.