segunda-feira, 18 de agosto de 2025

TEM QUE OUVIR: Syd Barrett - The Madcap Laughs (1970)

A loucura sempre foi um chamariz no campo artístico. Se não gera clamor comercial de imediato, com o tempo traz atenção e prestigio para artistas tidos como malucos no seu tempo. Isso aconteceu com Van Gogh e, no meio musical, com tantos outros, vide Brian Wilson, Peter Green, Skip Spence, Daniel Johnston, Arnaldo Baptista e Lanny Gordin. Agora, se antes de um surto psíquico, o artista consegue mudar os rumos do rock com um trabalho aclamado, como o clássico debut do Pink Floyd - The Piper At The Gates Of Dawn, de 1967 -, ai o culto é quase imediato.

Estando no centro criativo da ebulição contracultural que foi o rock psicodélico, Syd Barrett foi um dos que mais abusou do uso de LSD, despertando comportamentos erráticos, até chegar o diagnóstico de esquizofrenia, que o afastou não só do Pink Floyd, mas da música. Não sem antes - com ajuda dos amigos David Gilmour e Rogers Waters -, gravar um álbum solo, o experimental The Madcap Laughs (1970).

É um equivoco ouvir esse disco esperando grande acabamento. Isso não se dá nem por escolhas estéticas, nem pela capacidade técnica do Syd. Ainda assim, as canções revelam brilhantismo melódico/lírico mesmo diante de gravações caseiras lo-fi (se assemelhando a demos). Isso é exposto logo na canção que abre o disco, "Terrapin", um blues folk tão simples quanto irresistível.

Acompanhado por parte do Soft Machine - incluindo o o Robert Wyatt, que arrebenta com suas levadas nada uniformes na bateria -, "No Good Trying" soa como um sonho vertiginoso que não dá para saber onde vai desaguar. Adoro o canto falado do Syd. O grupo o acompanha também na simpática "Love You". Vale perceber aqui a crueza da gravação, que mesmo diante de ótimos músicos, revela a organicidade de uma jam feita as pressas.

A guitarra abelhuda e brilhante do Syd domina "No Man's Land". Quantas bandas de indie rock não gostaria de tirar esse som? 

Poucas canções falam tanto sobre Syd quanto "Dark Globe". Sua letra é estranha, meio delirante, muito emotiva. Tanto que seu canto aqui surge de maneira mais voraz, acompanhada por um violão de acordes martelantes. 

"Feel" guarda as mesmas características. Seu desenvolvimento é imprevisível, sendo que os acordes no meio parecem improvisados, de tão tortuoso que são os caminhos harmônicos. A letra e a performance comprovam esse senso de improviso. 

Com desafinações e até um erro inicial, "If It's In You" é o canto do cisne de uma mente em ebulição. Um registro mágico.

É legal ouvir Syd e Gilmour unidos em "Octopus", quase apontando o que aconteceria se eles tivessem tido mais tempo de trabalharem juntos no Pink Floyd. O mesmo vale para "Long Gone", sendo que aqui é a mão do Roger Waters que aparece com maior força.

"Golden Hair" é uma pérola. Seu violão soa quase como um drone. A melodia é tão linda quanto dramática e assustadora. A música parece reverberar no nosso subconsciente. A letra é baseada num poema do James Joyce. Maravilhosa!

Já a derradeira "Late Night" é marcada por um slide ébrio tocado com um isqueiro. 

Confeccionado pela Hipgnosis, com uma foto do Mick Rock, a capa resume bem o estado do Syd: um jovem solitário pela dificuldades impostas por suas ações e condição. Posteriormente, ainda foi lançado outros discos, grande parte com sobras de estúdio. Syd Barret ficaria recluso, levando uma vida silenciosa até sua morte em 2006 aos 60 anos, carregado durante esse período o fardo de "diamante louco".

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