quinta-feira, 22 de agosto de 2024

TEM QUE OUVIR: Bill Evans Trio - Portrait in Jazz (1960)

A lista de grandes pianistas da história do jazz é sem fim. Nas primeiras linhas certamente está o nome do Bill Evans, músico norte-americano que atravessou as décadas de 1940 e 1950 tocando sem parar, chegando no ápice ao adentrar o sexteto do Miles Davis, onde em 1959 ele gravou o emblemático Kind Of Blue, tendo inclusive colaborado em duas composições. No ano seguinte, sob maiores holofotes, formou um novo trio e gravou o clássico Portrait in Jazz (1960).

Aqui o pianista soma forças ao gênio do contrabaixo Scott LaFaro e o baterista Paul Motian. Com uma delicadeza instigante e erudição formal no approach, o trio foi responsável por dar uma cara mais moderna (e cool) ao jazz. 

"Come Rain Or Come Shine" abre o disco trazendo bloco de acordes rebuscado, de ar quase impressionista. O improviso ao piano parece "fechado" numa região, soando complexo, mas também conciso ao não se estender por toda a tessitura do instrumento. Paralelo a isso, o som profundo e livre do baixo acústico dá sustentação a música. Adoro como no fim o LaFato faz uso de um arco.

Se "Autumn Leaves" já é icônica por si só, aqui ela aparece numa de suas melhores interpretações. É magnifico como os solos piano, contrabaixo e bateria caminham paralelamente, se encontrando ao final sem ninguém precisar segurar a mão de ninguém. É uma viagem fluida de três músicos que nasceram pra tocar juntos.

Com fraseado quase blues no piano, walking bass dançante e uma condução de vassourinha na caixa, "Witchcraft" acompanha uma bebida amadeirada. O solo do Scott LaFaro é sinistro de tão desenvolto. 

"When I Fall In Love" é uma balada apaixonada, que mostra todo o lirismo do Bill Evans ao imprimir sua personalidade sem apagar a atmosfera da composição. Aqui vale destacar a cristalinidade da captação dos instrumentos.

"Peri's Scope" é a primeira composição do disco assinada pelo Bill Evans. Confesso achar menos inspirada - embora a performance seja irreparável -, ainda mais se comparada com outra faixa de sua autoria, a seminal "Blue In Green", que fecha o disco numa versão que não ouso ao dizer ser "melhor acabada" do que a encontrada no Kind Of Blue. Fino.

Por sua vez, a desconstrução que o trio faz de "What Is This Thing Called Love?" (Cole Porter) exemplifica o poder de criação que o jazz proporciona. Solo primoroso do Bill Evans, sempre acentuando a harmonia através de frases virtuosas.

O tom apaixonado, esfumaço e de luz baixa, volta com toda força na linda "Spring Is Here". Tem uma condução harmônica em seu meio que é de chorar. 

Não dá pra não mencionar "Someday My Prince Will Come", mais uma prova da excelência pianistica do Bill Evans. Seu inicio é quase erudito, pra depois se jogar num improviso fluido, com direito a acentuações rítmicas e uso de acordes primorosa. A condução sóbria do Paul Motian é uma aula de como tocar jazz.

O trio ainda gravaria outros álbuns na sequência, incluindo o também histórico Sunday At The Village Vanguard (1961). Todavia, Portrait in Jazz, como só poderia ser, é um retrato inicialmente mais convidativo não só para conhecer o trabalho do Bill Evans, mas também para se jogar no mundo do jazz.

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