Após trabalhos experimentais de qualidade duvidosa ao lado da Yoko, esse é o primeiro disco solo do Lennon formado por canções. Para isso ele voltou para Inglaterra e se isolou consigo mesmo, chamando para acompanhá-lo apenas o Klauss Voormann (baixo) e um tal de Ringo Starr (bateria). As guitarras e pianos são do próprio Lennon. Essa instrumentação enxuta, captada de forma tão majestosa quanto crua, ressalta ainda mais a força das composições.
Com uma letra direta ao ponto, "Mother" soa dilacerante. Ele discorre sobre a falta de sua mãe (que morreu quando ele ainda era uma criança) e o abandono do seu pai. Na época o artista havia conhecido a terapia primal, que consistia em externar traumas reprimidos através de berros, sendo que ele colou em prática a técnica no final da canção. Beira o assustador.
O clima não melhora em "Hold On". Apesar da linda melodia, da apaixonante guitarra com trêmulo e da singela interpretação, a letra é mais um momento de tristeza falsamente superada. Balada espetacular!
A crueza sonora de "I Found Out" faz da performance do trio a mais rockeira no álbum. A execução de todos é acachapante. Na letra, Lennon renuncia a tudo que foi apontado como salvação para humanidade, fosse as drogas, Krishna ou Jesus Cristo. Essa atitude é ressaltada de forma ainda mais explicita em "God", onde ele bota até Hitler e os Beatles no balaio. A cultura nos anos 60 é mais uma vez aniquilada.
Lennon encarna Dylan na espetacular "Working Class Hero", onde ele consegue com apenas voz e violão soar revolucionário. Fora que a melodia é espetacular.
Ao piano, "Isolation" é daquelas canções arrebatadoras. Adoro os vocais dobrados no refrão, a condução harmônica e bateria minimalista do Ringo. Tudo parece flutuar no ar.
A voz distante em "Remember" é uma transposição da letra para a mixagem. Já em "Love", o microfone parece captar o som do piano à quilômetros de distância da fonte. Nada disso é por acaso, visto que a produção do álbum ficou a cargo do não menos lendário Phil Spector.
Com berros animalescos, guitarras saturadíssimas, clima de jam, baixo pulsante e uma bateria de sonoridade estragada, "Well Well Well" expõe o maior nome do rock daquela época imerso na essência do gênero.
A derradeira "My Mummy's Dead" vem para pôr uma tampa no caixão das dores. Ou ao menos tentar. Tal vulnerabilidade deste disco levou a música pop à um novo patamar de composição.
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