Melancolia é a alma da boa canção. Ok, essa minha afirmação é um tanto exagerada, mas difícil de se contrapor quando analisamos algumas das melhores letras da música popular mundial. E se pensarmos na canção americana, John Prine é um dos grandes neste quesito.
Lançado em 1971 pela Atlantic, seu homônimo álbum de estreia entrega o que há de melhor no folk e na country music. É sentimental, autêntico, orgânico e retrata não somente (e abstratamente) um tempo, mas sim uma geração em confronto com sonhos utópicos e bombardeios reais.
"Illegal Prine" abre o disco com doses nada moderadas de ironia numa das melhores composições sobre drogas.
Embora remetendo sonoramente a uma já velha country music, é legal como em "Spanish Piperdream" debocha o lifestyle rockeiro daquele período. Isso com uma atitude textual curiosamente também rockeira.
Para um compositor de 25 anos, espanta como ele consegue retratar tão bem a velhice em "Hello In There". É ouvir e querer de imediato ligar para os pais (ou outro ser idoso que amamos). É de chorar.
"Sam Stone" é hino devastador sobre a morte de um veterano de guerra viciado em morfina. Vale lembrar que a canção foi lançada no auge da Guerra do Vietnã, o que trouxe um caráter politico para esse disco.
"Your Flag Decal Won't Get You Into Heaven Anymore" permeia esse mesmo conteúdo engajado, só que aqui com certo "astral humorado" e deliciosas frases de pedal steel.
Como um velho bluegrass (com direito a lindas dobras vocais e chorosa rabeca), em "Paradise" John Prine homenageia seu pai. É uma música rural que funciona por estar imersa em verdade.
Embora calcado na música folk, o momento mais Bob Dylan do disco é a rockeira "Pretty Good". Até a interpretação vocal lembra o Dylan, que diga-se de passagem, era ídolo, mas também fã do John Prine. Atenção para as ótimas guitarras do Reggie Young.
Com canto pausado e uma banda aconchegadamente posicionada dentro do arranjo, "Far From Me" traz uma sensação rural apaziguadora. É música de pôr do sol.
"Angel From Montgomery" foi regravada tantas vezes que virou praticamente um standard da country music. Mas é sempre bom voltar a versão original. Adoro a captação da gravação.
Humorado, dramático e existencialista, John Prine fez de seu debut um clássico da canção norte-americana, ainda hoje pouco conhecido no Brasil. Infelizmente ele faleceu em 2020, sendo uma das maiores perdas da música para o coronavírus.
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