Confesso que um dos gêneros que mais demorei para liquidar meu preconceito foi o neo-folk/indie-folk. Da melancolia lírica à rusticidade acústica, tudo me soava falso. E boa parte era mesmo. Sendo assim, foi um desabar de consciência conhecer o Fleet Foxes, justamente com o brilhante Helplessness Blues (2011), segundo trabalho do grupo.
Posteriormente escutando o debut desta banda oriunda de Seattle e lançada pela Sub Pop - velho roteiro triunfoso -, é nítido que eles já estavam em elevado patamar composicional. Mas o segundo álbum tem canções ainda mais memoráveis.
Embora Robin Pecknold inevitavelmente comande o grupo com suas composições e interpretações apaixonadas, não há como não destacar a presença do Josh Tillman (a.k.a. Father John Misty) e do produtor Phil Ek no disco.
É explicita a influência do folk sessentista no resultado final. Isso se revela nos timbres, harmonias vocais e sentimentos extraídos nas composições. Nada meramente decodificado, mas exalado na essência com a mesmo romance do passado. Tudo isso é sentido logo na abertura do álbum, com a linda "Montezuma".
É não menos que deslumbrante o crescer de "Bedouin Dress" diante de cada elemento que surge no arranjo, com direito a violões, ricas percussões, violinos, aberturas vocais à la Crosby, Stills & Nash, sintetizadores vintages, dentre outros instrumentos não identificados. Isso para não mencionar a fixante melodia.
Tem algo de Jethro Tull em "Sim Sala Bim". Inclusive surpreende não ser fruto de um grupo inglês. Há também motivos étnicos nas melodias. A faixa é calcada basicamente nos violões, com destaque para a surpreendente metade final.
"Battery Kinzie" invoca a tradição do menestrel. Mas engana-se quem pensa que é algo apenas "folclórico". A canção é altamente contagiante, inclusive por sua produção reverberosa à la wall of sound.
O brilhantismo lírico se mantém em "The Plains / Bitter Dance", sendo sua primeira parte impecavelmente arranjada, com direito a vozes que remetem ao período medieval, tanto devido os contracantos, quanto ao reverb catedrático. Tudo isso para desaguar num perfeito folk progressivo. Espetacular!
As utopias, lutas e redenções, desde sempre abordadas na música folk, se manifestam nesta geração através de "Helplessness Blues". A letra expõe nossos anseios (muitos que jamais serão saciados) com uma convicção jovial no sentimento, mas madura diante da realidade. Como se não bastasse, a interpretação é sincera e a melodia arrebatadora. A segunda parte é bela e solar. Um hino deste tempo.
Depois de tamanha paulada, a curtinha e instrumental "The Cascades" surge para apaziguar. Mais um momento de elegância e sabedoria.
Tem que ser muito pobre de espírito para não se sentir iluminado por "Lorelai", mais um vez de instrumentação exuberante. Arranjo e produção impecável.
Se havia alguma dúvida da eficiência vocal do grupo (e principalmente do Robin Pecknold), ela caí por terra diante da performance apaixonada na épica "The Shrine / An Argument". A magia também acontece instrumentalmente, com direito a níveis elevados de massa sonora extraído de instrumentos acústicos, dinâmica variada e até mesmo um solo de sax puramente free jazz. O desenvolver da canção é digno dos melhores momentos do prog folk.
Muito mais econômica é "Blue Spotted Tail", guiada por voz e violão, cochichada ao pé do ouvido. Linda melodia!
A derradeira "Grown Ocean" é um final perfeito para um disco com motivos de sobra para ser escutado. A música folk sobrevive com dignidade, inventividade e verdade via o Fleet Foxes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário