sábado, 11 de abril de 2015

TEM QUE OUVIR: Billie Holiday - Lady Sings The Blues (1956)

O mundo é curiosamente trágico. Se por um lado Billie Holiday recebeu o dom divino de cantar, por outro teve sua vida amaldiçoada. Não me refiro a poderes sobrenaturais, mas a sua real trajetória. Mulher, negra e pobre, foi estuprada quando criança, se prostituiu ainda jovem e, em meio a relacionamentos conturbados, foi viciada em drogas por toda sua vida. Definhou-se até a morte, aos apenas 44 anos, embora no fim parecesse uma senhora com o dobro da idade. 

No ano do seu centenário, passar a limpo um de seus principais discos, o impecável Lady Sings The Blues (1956), é fundamental para entender como, apesar de todas as adversidades, ela tornou-se uma das maiores vozes de todos os tempos, não só do jazz, mas da música como um todo.


Por mais humanamente trágico e egoísta que possa ser, a verdade é que suas quedas pessoais contribuíram para sua obra. De temas tristes que rodeiam as composições, passando por momentos em que sua voz já frágil provoca emoções sobrenaturais, é impossível desvincular a artista de sua arte. É tudo uma coisa só.

Sendo o derradeiro álbum lançado pela Clef Records, o disco traz sessões gravadas em períodos diferentes. Em comum temos a qualidade das composições e da interpretação, não só de Lady Day, mas também dos músicos que acompanham, dentre eles os lendários Willie Smith (sax), Chico Hamilton (bateria) e Kenny Burrell (guitarra).

Os arranjos leves e caprichados são expostos a serviço do canto pontual e celestial de Billie Holiday. Impossível não se emocionar com as lindas "Lady Sings The Blues", "Trav'lin Light", "I Must Have That A Man"... resumindo, todas!

A clássica "Strange Fruit" - a mesma escrita pelo professor judeu Abel Meeropol e interpretada também por Nina Simone -, ganha ainda mais força com Lady Day. Em sua voz encontra-se a de todos os negros linchados e expostos nas árvores no estado de Indiana. Daí as "frutas estranhas". Arrebatador.

Em tempos onde o termo "diva" foi banalizado e aplicado a qualquer estrela pop, ouvir a obra de Billie Holiday é um santo remédio.

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