terça-feira, 17 de março de 2015

TEM QUE OUVIR: Arrigo Barnabé - Clara Crocodilo (1980)

Embora nascido em Londrina (Paraná), Arrigo Barnabé foi um dos principais nomes da chamada Vanguarda Paulista (nome dado em homenagem ao Teatro Lira Paulistana), uma reunião de grupos/músicos/compositores - vide Itamar Assumpção, Grupo Rumo, Preme, Tetê Espindola, Ná Ozzetti, Isca de Policia, Patife Band, dentre outros - que desafiavam estruturas sonoras. O primeiro e principal registro deste movimento foi Clara Crocodilo (1980), uma referência em diversas questões, musicais ou não.


Sendo destaque em festivais universitários - em meio a aplausos e vaias - Arrigo Barnabé, pouco compreendido por gravadoras e produtores, lançou o álbum em formato independente, um pioneirismo que não comprometeu a qualidade técnica do trabalho, muito pelo contrário, garantiu a liberdade necessária para que ele e seus músicos colocassem em pratica sua singularidade composicional. Após o lançamento, não demorou muito para que seus shows recebessem figuras carimbadas da MPB, como Caetano Veloso, Rita Lee, Elis Regina, dentre outros.

Explorando não somente séries dodecafônicas - como acontece em "Office Boy" -, mas também outros módulos atonais executados em ritmos complexos - vide "Sabor de Veneno" (com direito a espetacular linha de baixo do Tavinho Fialho) -, Arrigo trouxe para a música popular brasileira elementos da música erudita do século XX, principalmente de compositores como Schöenberg e Béla Bartók.

As letras percorrem o caos das metrópoles e se assemelham a histórias detetivescas de quadrinhos. Já a interpretação vocal transita entre o erudito e a caricatura teatral/circense (no bom sentido) de um jornalista investigativo. Total Gil Gomes. Isso fica evidente na complexa "Infortúnio" e principalmente em "Clara Crocodilo". 

Falando em quadrinhos, vale lembrar que a capa do disco é de autoria do Luiz Gê, um dos mais criativos ilustradores da sua geração.

Impossível não atentar-se aos timbres de teclados e as frases esquizofrênicas de sax em "Diversões Eletrônicas", além do insano coro vocal feminino (e pré-Blitz) de Tetê Espindola e Vânia Bastos em "Acapulco Drive-In" e "Orgasmo Total". Uma aula de contraponto.

Não é difícil encontrar quem reconheça a Vanguarda Paulista como principal movimento da música brasileira pós-Tropicália. Embora com outros discos espetaculares, Clara Crocodilo continua sendo o grande ato deste período riquíssimo. 

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