quinta-feira, 21 de agosto de 2014

TEM QUE OUVIR: Raul Seixas - Gita (1974)

Semanas atrás, o jornalista André Barcinski escreveu algo que concordo plenamente, mas que não havia me ocorrido de forma tão clara: Gita é o maior disco do pop brasileiro!


Tenho uma ligação bastante pessoal com a obra do Raul Seixas. Ouço desde criança, no começo por intermédio do meu pai, pouco depois por vontade própria. Digo sem medo que foi o artista que mais ouvi na vida. Ele contribuiu fortemente na formação do meu caráter, mesmo tendo morrido um ano antes do meu nascimento. 

Gita (1974) é a obra do meio entre os três grandes discos do artista baiano. É também o trabalho que define sua parceria com o letrista Paulo Coelho, na época um ainda malucaço-hippie-ocultista. 

Como bem lembrou o Barcinski em seu texto, é incrível como as pessoas esquecem que, anos antes dos Paralamas, Raimundos e Chico Science & Nação Zumbi fundirem o rock com a música brasileira, Raul Seixas já apresentava pérolas como a linda balada caipira (com orquestração e harpa) "Medo da Chuva", o repente "As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor" e "Sessão das 10", um bolero brega perspicaz e irônico.

A influência mística do temido mago/bruxo/filósofo Aleister Crowley transparece nas emblemáticas "Trem das Sete" (de letra e arranjo majestosos), "Sociedade Alternativa" (em plena ditadura militar, interpretada com convicção impressionante) e na pesada "Loteria da Babilônia". Já a letra de "Super-Herói" é uma narrativa divertida em cima de um rock n' roll descontraído.

Os arranjos soberbos de Miguel Cirdas e a produção eficiente do Mazolla ajudam a dar o refinamento ao estilo popular do Raul Seixas. Isso fica evidente no swing-jazz sacana de "Moleque Maravilhoso", nas bonitas "Água Viva" e "Prelúdio" e, evidentemente, na épica "Gita", uma composição absurda de arranjo orquestrado grandioso. Um pop hindu calcado no Bhagavad-Guitá. Coisa de gênio.

Faltou comentar "S.O.S.", uma das minhas canções prediletas de todos os tempos. É um folk/country simples de refrão emocionante e letra genial ("Hoje é domingo, missa e praia, céu de anil, tem sangue no jornal"). Qualquer semelhança com "Mr. Spaceman" dos Byrds não é mera coincidência.

Para surpresa - ou não, isso não necessariamente importava - do André Midani da Philips, o disco vendeu muito, confirmando a teoria inicial: Gita é o maior disco do pop brasileiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário