segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

TEM QUE OUVIR: Dorival Caymmi - Canções Praieiras (1954)

Antes mesmo de João Gilberto gravar o clássico Chega de Saudade, outro compositor baiano se destacou com seu violão singular em composições majestosas. Me refiro a Dorival Caymmi, que em 1954 lançou Canções Praieiras.


Sem firula, Caymmi apresenta todas as suas qualidade sozinho, dispensando arranjos pomposos ou trejeitos do samba-canção. Aqui está "apenas" a sua voz, violão e letras sobre o cotidiano dos pescadores. Dá até para chamar de primeiro álbum conceitual da história. Na verdade é mais que isso, já que ele traduz com sabedoria e precisão a alma de um povo. 

É não menos que encantadora a melodia de "Quem Vem Pra Beira Do Mar". Dá para imaginar toda a geração da bossa nova ouvindo "O Bem Do Mar", que por mais distante do gênero pareça a voz empostada do Caymmi, sua linda harmonia muito lembra a de João Gilberto.

O violão na introdução de "O Mar" é espetacular. Caymmi faz de seu instrumento uma ferramenta de ambientação para suas letras. É uma nova concepção de harmonia, onde os acordes criam o pano de fundo para a poesia. Isso pode ser percebido também nas belas "É Doce Morrer No Mar", "A Jangada Voltou Só" e, principalmente, na assombrosa "A Lenda Do Abaeté".

A métrica e a sonoridade rítmica do canto de "Pescaria (Canoeiro)" é extremamente singular, sendo influenciada pelo baião, mas originando algo particular do Caymmi. Fechando o disco (que dá pouco mais de 20 minutos), temos "Saudade De Itapoan", um dos mais belos registros vocais do baiano.

Grande parte deste repertório foi revisitado no também clássico Caymmi E Seu Violão (1959), mas são as originais versões aqui encontradas as mais representativas e orgânicas (ao menos para mim). Canções Praieiras é um documento essencial para entender a canção popular brasileira. Emocionante.

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