domingo, 6 de dezembro de 2020

TEM QUE OUVIR: FKA Twigs - LP1 (2014)

Não é possível analisar a música pop sem considerar suas complexas subdivisões e interferências sonoras. Veja por exemplo o trabalho da FKA Twigs, que ao fundir art pop, trip hop e r&b contemporâneo, criou uma mutação densa e esteticamente arrojada. LP1 (2014) é uma pérola pop de requinte, vanguardismo e muita personalidade.

Vale dizer que, embora essa seja a estreia em disco da cantora inglesa, ela já vinha chamando atenção por alguns singles que uniam suas músicas à performances de dança exuberantes.

A introdução do álbum com "Preface" é um intrigante encontro de ritmos sintéticos de PC Music com contracantos que remetem a música renascentista, até mesmo por sua reverberação catedrática. Um inicio não menos que surpreendente.

As mãos da produtora Arca na construção de "Light On" é instigante e abstrata. O ritmo é criado explorando o silêncio e a ausência de um elemento pulsante definido. Gosto como, no refrão, um contrabaixo acústico traz um grave profundo em meio à elementos sintéticos.

De performance vocal majestosa e sexy, "Two Weeks" parece melodicamente solúvel, pulverizando-se num campo orgástico e etéreo. Nada mal para um single.

A cama de sintetizadores e os graves de "Hours" criam uma elegante tensão que, de alguma forma, me lembrou os momentos mais apaixonados do Nine Inch Nails. A mixagem é perfeita, com cada elemento se espalhando por todo espectro sonoro como micro matérias que preenchem nossa mente.

O downtempo de "Pendulum" cria espaço para o empilhamento riquíssimo de timbres e elementos rítmicos complexos. Isso tudo serve de cama para uma das melhores performances vocais da FKA Twigs. Aqui é possível lembrar dos momentos mais atmosféricos da Kate Bush.

"Video Girl" soa como se a Björk tivesse malemolência. É uma canção que consegue soar acessível mesmo ao explorar graves sintéticos robustos, ritmos intricados e até mesmo interferência glitch na produção.

De beat esquelético/metálico apontando para a vanguarda da música eletrônica, "Numbers" é noturna, densa e vocalmente ultra melódica (além de impecavelmente interpretada). Tem muito de trip hop no clima da canção, sendo o Sampha um dos responsáveis pela produção.

A vocalização distante em "Closer" é perfeitamente fundida num beat cristalino e esquisito no primeiro plano na mixagem.

Arca volta a dar as caras em "Give Up", faixa dona de uma rica camada de graves e um raciocínio quase orquestral (embora completamente sintético) na criação do instrumental.

"Kicks", a mais longa do disco, é um desfecho belíssimo. Há algo de wonky no beat, ao mesmo tempo que sintetizadores geram camadas elegantes que parecem flutuar junto da voz da Twigs.

Se a música é arte que trabalha a organização dos sons, é indiscutível que LP1 é tecnicamente e emocionalmente uma obra de grande proficiência.

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