segunda-feira, 2 de novembro de 2020

TEM QUE OUVIR: Ariana Grande - thank u, next (2019)

Sempre tive muita resistência ao trabalho da Ariana Grande. Uma artista "fabricada", vinda de programas infanto-juvenis da Nickelodeon e inspirada vocalmente na Mariah Carey. Simplesmente não era para mim.

Mas quem sou eu na fila do pão? Com distanciamento vi ela explodir e tornar-se uma grande estrela pop, sendo que em seu quarto álbum, Sweetener (2018), ela recebeu tantos elogios que decidi dar uma chance. Para minha surpresa, adorei. Era pop, elegante, sexy, bem interpretado, ganchudo... ótimo!

Quando menos de um ano depois ela anunciou thank u, next (2019), olhei com desconfiança. Imaginei ser uma sequência apreçada. Não acreditei na capacidade dela repetir o êxito. Queimei a língua novamente.

O disco é impecavelmente produzido, abusando de texturas ricas, ainda mais para os padrões do pop atual. O instrumental é elegante e, de certa forma, bastante minimalista, muitas vezes se apropriando de beats de trap, embora calcado na estética do r&b contemporâneo.

Vale lembrar que o álbum foi concebido após a prematura morte do rapper e namorado da Ariana, Mac Miller. Além disso, foi no show da cantora o terrível atentado em Manchester que feriou 112 pessoas e tirou a vida de mais 22. Tais episódios inegavelmente trouxeram maturidade composicional diante da tristeza e vulnerabilidade. As canções ficaram muito mais introspectivas e darks, embora sem perder o perfil pop.

"imagine" abre o disco com singela melodia, interpretação soberba e reverb profundo. Há um clima noturno de aroma quase jazzistico em 3/4. Bela progressão de acordes, arranjo e linha de baixo. Já no final da faixa surge agudos vocais que eu nem sabia ser possível alcançar.

O beat minimalista e os acordes aconchegantes de "needy" preparam terreno para uma melodia apaixonante. A orquestração final traz ainda mais elegância para a canção.

Em "NASA", tanto o beat com aproximação do trap quanto a letra de mulher autossuficiente condiz com o mundo pop atual. Essa contemporaneidade se manifesta também na latinidade do groove de "bloodline". O resultado é dançante.

Além de utilizar muito bem o sample de "After Laughter" em "Fake Smile", a composição tem como principal qualidade expor com sinceridade todo o sentimento da Ariana diante de suas tragédias e o que se espera dela. Vale ainda dizer que sua voz é tão agradável que até um "foda-se" soa belo.

"bad ideia" é daqueles pops com refrão que parece feito sob encomenda. E deve ser, vide que o sueco Max Martin assina a composição. Não é dos momentos mais atrativos, talvez por se perder na duração.

Com ritmo vagarosamente torto (adoro essa caixa!), grave gorduroso e belo arranjo vocal, "make up" tem até um quê de reggae no seu balanço. Bem legal.

De atmosfera espacial, quase ambient, "ghostin" se espalha para o além. É uma bonita canção cheia de memórias, afetividade e melancolia. Mais uma vez o tom é bastante pessoal.

Com arranjo variado, interessante produção e beat intricado, "In My Head" cresce através dos detalhes.

No fim do disco há uma avalanche de singles, começando por "7 rings", de melodia, beat e interpretação sexy e cheia de confiança. 

A maturidade musical e independência diante dos relacionamentos apresentada em "thank u, next" é impressionante. Seu conteúdo gay é espontâneo e singelo. Adoro a linha de baixo e a melodia (mais uma vez!).

De timbre dark que bate no peito, "break up with your girlfriend, i'm bored" faz de um triangulo amoroso uma das faixas mais legais da música pop nesta década.

Confessional, sincero, de canções memoráveis e performance arrebatadora, thank u, next vai muito além da banalidade que muitos projetam na Ariana.

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