sexta-feira, 11 de março de 2016

Sim, nós temos pós-punk

Devo confessar que conheço a maioria das bandas do rock underground paulistano oitentista somente pelo nome. Sendo assim, a coletânea The Sexual Life Of The Savages (lançada pelo selo inglês Soul Jazz Records em 2005) foi uma maravilhosa porta de entrada a esse mundo oposto ao som ensolarado do Paralamas do Sucesso.


Logo de cara no disco temos duas estupendas músicas ("Inimigo" e "Pânico") das Mercenárias, banda da Sandra Coutinho. Para um grupo que sempre associei a tosquice do movimento punk, achei tudo extremamente complexo e bem tocado. Alguém saberia me informar se o Scandurra ainda fazia parte da formação quando ambas as faixas foram gravadas? O que sei é que preciso ouvir mais o grupo. Sensacional!

Sobre o Akira S & As Garotas Que Erraram (baita nome!) só sabia que era a banda do Alex Antunes, um agitador cultural que ficou bastante ligado a revista BIZZ. Fiquei surpreso com a qualidade sonora - que linha de baixo fretless fantásticas em "Eu Dirijo O Carro Bomba" - e as letras surrealistas. Bem a frente do tempo se pensando em Brasil.

Fellini, banda cultuada que nasceu na ECA e que tinha na sua formação Cadão Volpato, Ricardo Salvagni e Thomas Pappon, participa da coletânea com a clássica "Rock Europeu". Destaque para a ótima linha de baixo, a bateria quase tribal, guitarras cacofônicas e um estilo de cantar que me remete ao começo da carreira do Arnaldo Antunes.

Já havia escutado o disco da Gang 90 (do lendário Júlio Barroso), mas não lembrava de ser tão bom quando a música aqui presente, "Jack Kerouac". Preciso reouvir o disco. Som meio etéreo.

Depois veio uma banda da qual nunca ouvi falar: Chance. E pela primeira vez percebi que a célula rítmica do samba pode virar pós-punk. Faixa bastante psicodélica. Talvez algo que aconteceria se o krautrock fosse um movimento brasileiro.

Quando chegou na Patife Band finalmente estava em território conhecido. O grupo liderado pelo Paulo Barnabé é um dos meus prediletos de todo o rock brasileiro. Sua mistura de música de vanguarda, rock progressivo, jazz e, claro, pós-punk, é o maior símbolo do que seria a no wave paulistana. E nada supera "Poema Em Linha Reta". Genial!

Gosto do Gueto, inclusive tenho o disco, mas confesso que "Borboleta Psicodélica" passou batida diante das outras novidades que eu aguardava.

E ai veio o Nau, banda do guitarrista Zique e da cantora Vange Leonel. Sempre ouvi falar, mas nunca tinha parado para escutar com a devida atenção. Gostei muito! Preciso agora procurar o cultuado disco lançado pelo grupo em 87.

Smack é o grupo que compila o talento de toda a cena alternativa da época (Pamps, Scandurra, Sandra Coutinho e Thomas Pappon). Ambos os sons selecionados ("Fora Daqui" e "Mediocridade Afinal") são sensacionais. Vale conferir os discos da banda, tanto o urgente Ao Vivo no Mosh (1984) quanto o esquisito Smack (1986). 

Já o Muzak, o Killing Joke brasileiro, é de sonoridade doentia. "Ilha Urbana" é uma paulada. É legal ressaltar que o critico musical Régis Tadeu chegou a fazer posteriormente parte da banda.

Cabine C (do ex-Titãs, Ciro Pessoa) soou a banda mais comum e menos interessante dentre tantos grupos legais. Talvez a música mais gótica do disco.

Para finalizar temos o Harry do Johnny Hansen com a doce melodia de "You Have Gone Wrong", tentando (e de certa forma conseguindo) emular o som eletrônico das bandas inglesas.

É isso. Um coletânea bem legal e disponível no YouTube para todos ouvirem. Portanto, quando falarem de pós-punk nacional, evitem os dois simpáticos primeiros discos da Legião Urbana. Temos algo melhor que aquilo.

Obs: Ótimo trabalho da gravadora que compilou as músicas, mas não poderia deixar de mencionar o Luiz Calanca, a cabeça por trás da Baratos Afins, que lançou a maioria dessas bandas.

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