Antes de falar sobre os shows do ano, vale pontuar algo que poucos dizem de forma clara: nenhum evento é imperdível!
As vezes vomitamos nossas experiências como se isso fosse indispensável para compreender a arte, quando na verdade ela é apenas um privilégio de poucos. Falar de shows imperdíveis quando a situação econômica da maior parte da população anda em frangalhos e os ingressos para os eventos são de valor proibitivo (vale ressaltar, não necessariamente por culpa da produção dos eventos) é no mínimo bobagem.
Uma solução para driblar essa loucura que virou os grandes eventos, tem sido ir a pequenos shows pela cidade. E posso garantir que, enquanto experiência musical, muitas vezes é até melhor que os shows badalados.
Dito isso, vale listar alguns shows que rolaram, mas que perdi:
Accept (inclusive em Santo André, cidade que moro), Acid Mothers Temple, Ariel Pink, Avishai Cohen, BABYMETAL, Batushka, Bikini Kill, Biohazard (com a formação clássica), Black Pumas, Blink 182 (pela primeira vez no Brasil), Bruce Dickinson, Charles Lloyd Quartet, Christone “Kingfish” Ingram, Clutch, Daniel Caesar, David Cross, Death To All, DIIV, Dinner Party (Terrace Martin, Robert Glasper & Kamasi Washington), Dinosaur Jr., Discharge, Eric Clapton, Eric Gales, Eric Prydz, Fantastic Negrito, Iron Maiden (com direito a última apresentação do Nicko McBrain na banda), Jamie xx, Joe Bonamassa, Junior Marvin, Kamaal Williams, Katatonia, Keane, King Gizzard And The Lizard Wizard, King Krule, KOKOKO!, Lianne La Havas, Lightning Bolt, Lucifer, Madonna (o famigerado show gratuito em Copacabana), Mercyful Fate, Mobb Deep, Moto Perpétuo (fizeram um único show comemorativo), New Model Army, Pavement, Picture, Poppy, Possessed, Rapsody, Replicantes (show com integrantes de todas as formações), Russian Circles, Shelter, Sleafords Mods, Squid, Suicidal Tendencies (em shows gratuito, mas disputadíssimo), Sullivan & Massadas (primeiro show em 34 anos), The Dandy Warhols, The Lemonheads, The Mission (em Santo André), The Obsessed, Thursday, Toto, Travis, Turnover, Turnstile (que eu queria muito ter levado a Maria), Vandenberg, Vio-Lence, Young Fathers, Yussef Dayes, dentre outros.
Agora sim, vamos aos shows que eu fui:
O Terno
Gosto da banda, mas não o suficiente pra ir atrás de show. Mas um ingresso caiu em mãos e fui conferir. Achei a apresentação ótima. Claro, dentro da proposta. Se você já for sem disposição pro som do grupo, vai ser furada. Isso porque eles fazem no palco aquilo que produzem em estúdio. Inclusive com uma competência (técnica, sonora, interpretativa, de arranjos) poucas vezes vista dentro do rock brasileiro. Todos parecem genuinamente talentosos. Shows incrivelmente redondo.
Bufo Borealis / Desalmado / lotico / Lamar
Fim de semana aqui em Santo André, no 74Club, com 4 ótimas bandas atuais. Destaque óbvio para o Bufo Borealis, dono de um som instrumental muito bem desenvolvido; e o Desalmado, que se revelou ainda melhor ao vivo, com todos extraindo muito peso de seus instrumentos, com destaque para o excelente baterista.
Roupa Nova
Tocaram aqui no centro da cidade, na prefeitura. Fui conferir. Se shows gratuitos tendem a ser tumultuados, neste se revelou comovente. Muito legal ver pessoas de meia idade emocionadas com canções que pareciam ser a trilha sonora de suas vidas. E como eles tem hits, não? Ainda que não ouça a banda em casa, posso garantir que eu conhecia TODAS as músicas do repertório. Musicalmente eles entregam o que prometem: ótimas performance, tanto vocal quanto instrumental. Achei o Serginho discreto. Sempre imaginei que ele tivesse uma personalidade mais atrativa em cima do palco, mas ele apenas se restringiu a tocar bateria pra caralho. Kiko também quebrou tudo. Bandaça. E fica a reflexão: se o Roupa Nova é o Toto brasileiro e o Brasil é melhor que os EUA, então o Roupa Nova é melhor que o Toto?
Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo / Terraplana
Segunda edição do Festival Casaberta, evento gratuito que rola em São Bernardo do Campo. Muito bem organizado e com escolha interessante de bandas. Adorei o show da Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, soando ora estranho, ora com ternura, ora barulhento. Banda de personalidade e carisma. Já o Terraplana, apesar de muito legal, se mostrou mais inexperiente. Faltou massa sonora, ainda mais se pensarmos que eles são os grandes representantes do shoegaze brasileiro contemporâneo. Mas a banda ainda tem tempo pra evoluir. Parabéns pra organização.
Tortoise
Não é sempre que podemos ver uma banda como o Tortoise tocando num local convidativo (Cine Joia) um álbum clássico na íntegra (TNT, de 1998). Achei o show ótimo e menos burocrático que eu imaginei. Digo isso porque rolou algumas bolas na trave que trouxeram espontaneidade para a apresentação. Ótimo show. Pena que tinham uns hipster que estavam lá só pela onda e insistiam em conversar durante a apresentação.
Marcos Valle
Dos medalhões da música brasileira, o Marcos Valle era um que faltava cortar da minha lista dos que ainda não havia assistido. Por sorte consegui ver numa grande apresentação, sentadinho, num teatro confortável do SESC, celebrando seus 80 anos com um repertório variado que abraçou diferentes fases de sua brilhante carreira. Não só ele tocou demais, mas sua banda também é ótima. Quero envelhecer com a dignidade dele. Podemos chamá-lo de gênio né?
Plebe Rude
Mais um dos shows gratuitos aqui na prefeitura de Santo André. Começou capenga, mas quando começaram a emendar faixas d’O Concreto Já Rachou, ai eles lembraram porque são a melhor banda daquela safra de Brasília. O final do show foi arrasa quarteirão. Tocaram até Cólera e Inocentes. Um bailão do rock nacional pra ninguém botar defeito.
Black Pantera / Vazio / Cras
Mais um evento no 74Club, que vale dizer, é um espaço muito pequeno (um porão, com a banda na mesma altura do público). Deve caber umas 60 pessoas. Deste modo, ver uma banda que tá cada vez com maior destaque como o Black Pantera nesse espaço é uma tremenda oportunidade. E reforço com convicção: eles são uma espetacular banda ao vivo. Muito melhor que em estúdio. Tem energia, carisma e convicção. Sabem lidar com o público. A cozinha é ultra consistente. Me senti vendo algo como o Planet Hemp antes de explodir. De quebra, no mesmo dia teve um ótimo show do Vazio, que já queria assistir há muito tempo e mostraram que são realmente um destaque no cenário black metal brasileiro; e o Cras, que embora soe meio repetitivo nos arranjos e na forma das canções, foi bacana.
Angra - acústico
Ganhei o ingresso numa promoção do Wikimetal, então fui lá conferir. Gosto da banda, tinha expectativas pra o que viria sair desse formato acústico. Não posso dizer que gostei. Assim como se revelou no disco, os arranjos tem problema de “proposta”. Solos que não dizem nada, bateria acovardada, vocais exagerados de sempre… o que salvou foi a presença da Vanessa Moreno, que trouxe uma bela voz em todas as faixas que ali cantou (umas 3). Show com cara de freio de mão puxado. Não me espanta eles terem anunciado uma pausa.
FBC
Por ter sido um show no SESC da minha cidade, consegui assistir com a Reninha e minha filha, que vale dizer, conhece e gosta das músicas do FBC. Show divertido, que passeia por suas diferentes “eras”. Inclusive, foi aí que notei como ele tem uma carreira versátil, indo do rap, funk e pop com a maior facilidade. Boa banda, grande carisma, repertório bacana… Tudo certo.
Smashing Pumpkins
Não sei se vocês tem memória afetiva com aquelas fitas verdes da Disney ou com os filmes da Pixar? Eu não tenho. Mas tenho com as bandas que passavam na MTV nos anos 90. Cheguei a conclusão que, para mim, o Smashing Pumpkins é a mais emblemática nesse sentido. De algum modo eu sempre entendi “Disarm”. Assistir o show deles foi tipo eu ir pra Disney. Massa o Billy Corgan ter deixado de ser um “mala” né? Chamou os camaradas de volta pra banda, toca os hits que todo mundo quer ouvir, tá sorridente, tá leve… E tocando guitarra pra cacete. Gosto como no fundo ele é um “metaleiro”, que deixa rolando Judas Priest antes do show e faz solos shred de 6 minutos na frente de seu público indie. Um herói. Não posso deixar de mencionar o Jimmy Chamberlin, indiscutivelmente um dos melhores bateristas da sua geração. As vezes parece que ele poderia estar no Tool. Performance absurda e O MELHOR SOM DE BATERIA QUE JÁ OUVI AO VIVO. Tudo soou muito pesado. Até “Tonight, Tonight”. Ouvir ao vivo “Today”, “Mayonaise”, “Jellybelly”, “Cherub Rock”… coisa de maluco. Foi demais. Vale ainda lembrar que rolou um show de abertura apenas ok do Terno Rei (já os vi em momentos mais bacanas).
Converge
Após décadas de espera, finalmente a banda veio pro Brasil, levando ao Cine Jóia um público sedento pelo som nocauteante da grupo. Tecnicamente a banda desempenhou impecavelmente. Que entrosamento, que timbres! Ouso dizer que eles tem uma das melhores cozinhas da história do metal. Já o Kurt Ballou é um herói pessoal. Uma noite nervosa e emotiva, com direito a ótimo show de abertura do MEE.
Hurtmold
Olha, nunca tinha visto a banda ao vivo, tendo sido agraciado por poder assistir no 74Club, na cara da banda. Arrisco dizer que, talvez, foi melhor que o show do Tortoise. É uma cria, mas se mostrou um aperfeiçoamento. Vou parar por aqui. Se tiverem oportunidade de ir num show não percam.
Ludovic
Adoro a banda e já tive a oportunidade de vê-los outras vezes, mas desta vez foi a mais vibrante. E vibração é uma palavra que resume bem, já que o Jair Naves não sai de casa pra fazer apresentações burocráticas. Ele entrega performances apaixonadas e intensas. Legal ter assistido já no final da turnê, com todos num entrosamento afiado. Repertório matador.
Lúcio Maia Trio
O outrora guitarrista da Nação Zumbi e eterno guitar hero tocou em trio numa festa com o selo de qualidade do Fábio Massari organizada, mais uma vez, no 74Club. O batera é o do Bufo Borealis e o baixista do Hurtmold. Um time de respeito. Ele apresentou um repertório instrumental que fica entre a guitarrada paraense e a psicodelia hendrixiana. Tudo com timbrão e performances afiada. Felizmente consegui assistir ao lado da Reninha e da minha filha, o que tornou tudo mais especial.
Caetano Veloso & Maria Bethânia
Aqueles momentos em que a realidade se impõe. Adoraria falar mal, mas a verdade é que foi espetacular. Nunca tinha visto a Maria Bethânia ao vivo e confesso que não sairia de casa pra ver um show solo. Mas ela calou minha boca e mandou bem demais. Ela realmente tem um carisma e grande voz. Seu momento solo, em que enfileirou seus principais hits, fez de mim um súdito. Sobre o Caetano vale reforçar o óbvio: um dos maiores compositores da canção brasileira. Sempre bom revisitar seu repertório e ouvir ao vivo canções históricas, excelentes e que pessoalmente amo. Achei que o fato de ser um show em estádio ia deixar a apresentação morna, mas foi bem vibrante. Excelente banda e arranjos, com destaque para as percussões. Produção pra gringo algum botar defeito. Obrigado a minha irmã por ter me dado o ingresso e ter me permitido viver isso ao lado da Reninha.
Descendents & Circle Jerks
O que assistir um dia depois do Caetano & Bethânia? Uma dobradinha de Circle Jerks e Descendents no Hangar 110. Basta dizer isso pra chamar esse show de histórico dentro da cena punk/alternativa brasileira. O Circle Jerks fez uma boa apresentação, mas deixou uma sensação de arrastada por conta dos longos discursos do Keith Morris. Ele deve ter falado, sem brincadeira, uns 40% do tempo. Ao menos o Joey Castillo tava lá na bateria pra fazer cada canção saltar aos ouvidos. Fora que dividir o mosh com Juninho do Ratos de Porão e o Rodrigo do Dead Fish ao som de “Wild In The Streets” já faz valer o ingresso. Mas tinha mais. O Descendents dominou a noite. Banda impecável no palco, tanto em carisma quanto em técnica. O Bill Stevenson tocou sua bateria com uma categoria exemplar. O repertório foi pra ninguém botar defeito. O público aderiu com uma energia que poucas vezes presenciei. Nesse campo de pop punk/hardcore melódico, ninguém se sai melhor que eles. Uma maneira impecável de fechar o quesito shows em 2024.
Ah, vale ainda dizer que assisti o Stop Making Sense do Talking Heads no cinema, que de tão espetacular deveria valer como show; e uma discotecagem do lendário DJ Hum na Fatiado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário