sexta-feira, 2 de novembro de 2018

TEM QUE OUVIR: Rio 65 Trio - Rio 65 Trio (1965)

Uma das vertentes musicais mais criminosamente ignoradas da música brasileira é o samba jazz. Se nos EUA, Europa e Japão os discos do estilo são cultuados, aqui no Brasil eles sequer são relançados.

Formado em grande parte por trios instrumentais, o estilo tem como característica o cruzamento do jazz americano (principalmente o bebop) com o samba brasileiro. Do primeiro foi extraído a complexidade dos improvisos e a estrutura das composições. Do segundo os ritmos swingados e típicos do Brasil. Em comum havia a qualidade das harmonias, fruto também da ascensão da bossa nova, que formou grande parte dos instrumentistas do samba jazz.

Sambalanço Trio, Som Três, Zimbo Trio, Tamba Trio, Milton Banana Trio, Dom Um Romão e J.T Meirelles são alguns nomes que merecem destaque. Todavia, como porta de entrada, recomendo o espetacular álbum de estreia do Rio Trio 65.


Formado pelo pianista Dom Salvador, o baterista Edison Machado e o contrabaixista Sergio Barrozo, o grupo é para mim o que soa musicalmente melhor resolvido. Digo isso sem apontar deméritos, apenas como forma de exaltar esse brilhante trio.

Basta ouvir a faixa de abertura, a intensa "Meu Fraco É Café Forte", para perceber o alto nível de interação dos instrumentistas, o balanço irresistível, a performance voraz, a produção tão orgânica quanto nítida e a força do tema. Um arraso!

O álbum é carregado de versões para composições de artistas da bossa nova. Exemplos não faltam: a bela "Preciso Aprender A Ser Só" (Marcos Valle), a sempre encantadora "Desafinado" (Tom Jobim), a ritmicamente desconcertante "Tem Dó" (Baden Powell), a clássica "Manhã de Carnaval" (Luiz Bonfá) e a de lirismo melódico impressionante "Minha Namorada" (Carlos Lyra). Já a influência do jazz é explicitamente manifestada em "Sonnymoon For Two" (Sonny Rollins).

Eu poderia fazer verdadeiro tratado sobre a pegada avassaladora, as levadas swingadas/sincopadas e o bumbo irreverente do lendário Edison Machado. Ou então sobre os improvisos irradiantes do Dom Salvador e de como o Sergio Barrozo coloca seu instrumento em destaque em meio a dois gênios. Todavia, é melhor mesmo você tirar a sua própria conclusão. Escute ao menos "Farjuto", se não gostar eu devolvo o dinheiro na hora.

Esse disco nos leva a um esfumaçado beco das garrafas de um Rio de Janeiro que não existe mais. Uma obra-prima da música instrumental mundial.

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