sábado, 29 de novembro de 2014

TEM QUE OUVIR: The Beach Boys - Pet Sounds (1966)

Existe ainda hoje quem de imediato associe os Beach Boys ao surf rock divertido de seus primeiros álbuns. Todavia, na hora de apontar o grande clássico na imensa discografia do grupo, é praticamente unânime a escolha de Pet Sounds (1966).


É lendária a "rivalidade" que o grupo teria com os Beatles (que acabara de lançar Rubber Soul), sendo cada disco uma resposta criativa ao "adversário". Mas muito mais que uma suposta competição, Pet Sounds (1966) é o registro que serve de base para muito do que a música popular iria (e irá) encarar nas décadas seguintes.

Composições não menos que geniais - superando os antigos temas: praia, sol, carros e biquíni - recebem arranjos absurdos e cristalinos. Isso foi arquitetado pela mente alucinante/paranoica/genial de Brian Wilson, que transitava entre as mais elaboradas estruturas da música erudita, experimentações psicodélicas e a abordagem acessível e melódica da música pop jovem. Daí brotam pérolas clássicas como a deliciosa (e mega citada em filmes) "Wouldn't  It Be Nice" e a sentimental "God Only Knows". Ambas tão solares quanto angustiantes.

Entre orquestrações - com direito aos mais diversos pianos, instrumentos de cordas sinfônicos, trombetas, flautas, sinos, teremin, campainhas, latas, latidos e outras traquinarias -, e harmonias vocais alucinantes, destacam-se "You Still Believe In Me" e as lindas "Don't Talk" e "Caroline No". 

A colaboração de músicos requisitados da Wrecking Crew - vide Carol Kaye (baixo), Jim Gordon (bateria), Hal Blaine (percussão), Tommy Tedesco e Barney Kessel (guitarra) - e a utilização de técnicas de gravação como a wall of sound - de criação do lendário Phil Spector -, deram o toque de sofisticação e grandiosidade sonora necessária a obra, exemplificado na exuberante "Let's Go Away For Awhile".

A dramaticidade das interpretações e das letras também ajudaram no prestigio quase irracional que a obra ganhou com o passar dos anos, ainda que a Capitol não tenha se esforçado na divulgação do disco na época de seu lançamento. Um trabalho que transcende o tempo e, que no final das contas, sobrevive graças a profundidade do resultado sonoro. Clássico da capa até a última nota.

A neo-psicodelia que vale a pena

Neste exato momento em que escrevo essas mal traçadas linhas, está passando no canal BIS o show do Tame Impala no Popload Festival, um festival que merece aplausos por trazer ao Brasil bandas nem tão óbvias em lugares pequenos.

Mas voltando ao Tame Impala: não entendo essa aclamação. Acho a banda superestimada desde que ouvi o fraco Lonerism (2012). De que adianta guitarras vintages, delays intermináveis, luzes piscando e telão com cores lisérgicas, se as composições são insossas?

Com tantos grupos interessantes, impressiona muitos considerarem o Tame Impala como o grande representante desta nova cena psicodélica que vem há anos ganhando espaço. Pensando nisso, fiz uma lista só com bandas que lançaram discos em 2013. Tem psicodelia de todas as formas possíveis e de várias partes do mundo.

Obs: Desisti de assisti o show do Tame Impala. Preferi ver no SBT a homenagem ao criador do Chaves e Chapolin, o grande Roberto Bolaños.

Earthless

Thee Oh Sees

Acid Mothers Temple

Bombino

Catavento

Deerhunter

Foxygen

The Baggios

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

TEM QUE OUVIR: O Terço - Criaturas da Noite (1974)

Rio de Janeiro, conhecida musicalmente como o berço do samba, foi a cidade que mais abraçou o rock progressivo, que explodiu principalmente na Inglaterra na primeira metade da década de 1970. Do Rio saiu O Terço, grupo que lançou Criaturas da Noite (1974), um dos trabalhos fundamentais do rock nacional.


Já com dois discos na bagagem e mudanças de formação, a banda se encontrou na união de Sérgio Hinds (guitarra), Sérgio Magrão (baixo), Luiz Moreno (percussão) e Flavio Venturini (teclados), sendo que todos colaboram com sofisticadas harmonias vocais, vide o que acontece na linda "Criaturas da Noite", com direito a arranjo orquestrado e final épico.

"Hey Amigo", dona de espetacular introdução de dinâmica crescente, é um dos grandes clássicos do rock nacional setentista. O mesmo vale pra grandiosa "1974", que reúne o que há de mais viajante no progressivo, tendo leves toque de Pink Floyd e melodias fantásticas.

"Pano de Fundo" e "Volte Na Próxima Semana" transparecem uma estranheza tanto na letra (que lembra o que os Titãs faria anos depois) quanto no instrumental rebuscado. Já "Ponto Final" é uma bela composição calcada em teclados/sintetizadores modernos da época.

Somando ao estilo uma originalidade brasileira, característica herdada pelo Venturini (que fez parte do Clube da Esquina), O Terço conseguiu uma importante identidade sonora. Isso fica nítido na caipira "Queimada" (com direito a violas) e na folk "Jogo das Pedras".

Embora cultuado somente num nicho saudosista, ouvir Criaturas da Noite, além de ser uma experiência extremamente prazerosa, pode servir de aprendizado para as novas gerações de como fazer rock com raízes brasileiras.

ALGO ENTRE: Brian Eno e Geddy Lee

BRIAN ENO
Sabe a música da década de 1980? Pois então, foi o Brian Eno que inventou.

GEDDY LEE
Sonzeira que abre o disco solo do Geddy Lee. Conheci somente agora.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

TEM QUE OUVIR: Neil Young - On The Beach (1974)

Após o sucesso comercial e artístico do álbum Harvest (1972), criou-se uma expectativa para o que o Neil Young estaria fazendo. Já tratado do vício em heroína e superando a perda de amigos para as drogas - incluindo o parceiro de Crazy Horse, Danny Whitten -, On The Beach (1974) é a lágrima cristalina de uma fase melancólica do artista, comumente chamada de ditch trilogy.


Embora de voz frágil, "Walk On" soa como um convite à superação. Todavia, a tristeza parece enraizada na doce balada caipira "See The Sky About To Rain" - com direito ao pedal steel fabuloso do Ben Keith - e na ritmicamente arrastada "On The Beach", que traz um dos grandes momentos na guitarra do Neil Young.

Os membros da The Band - Levon Helm (bateria) e Rick Danko (baixo) -, além de David Crosby (guitarra), colaboram em "Revolution Blues", que faz referência ao psicótico Charles Manson. O blues também dita o ritmo na ótima "Vampire Blues" - dona de um solo de guitarra estranhíssimo - e na longa "Ambulance Blues". Já a vibe rural puxada para a country music está presente no banjo de "For The Turnstiles".

O clima depressivo que rondava o artista não foi desta vez bem recebido pela crítica e as vendas do disco não corresponderam a expectativa. Todavia, após o Neil Young relutar durante anos em relançar a obra, o álbum ganhou seu devido reconhecimento, muito graças a sinceridade das composições e da interpretação, que captam a ressaca da contracultura.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Pitacos sobre o show do Macca

Faz menos de 24 horas que presenciei o show do maior compositor vivo e, muito provavelmente, maior compositor da música POP de todos os tempos. É óbvio que estou falando de Paul McCartney. Como de costume, gosto de dar pitacos sobre o que vi, só que desta vez as 140 caracteres do Twitter não foram suficientes. Deste modo, meio embriagado, recorro a esse meu humilde blog.

1º Pitaco: Allianz Parque.
Pode chamar de clubismo, birra, inveja ou qualquer outra palavra que tente desmerecer a minha honesta opinião, mas o que penso é que o Allianz Parque é conceitualmente uma droga. É evidente que o fácil acesso é uma maravilha (que, diga-se de passagem, de nada adianta ter metrô do lado se quando os eventos acabam ele está fechado, vide ontem), mas me incomoda essa "modernização" sem propósito. Para espetáculos musicais, a nova arena nem se compara ao antigo Palestra Italia (melhorou muito no quesito acústica), mas para jogo acho lamentável. Deixa passar a euforia e começará a aparecer pessoas com saudades de comer amendoim, sentado no cimento, de chinelo, vendo o pequeno Palmeirinhas jogar. Cadeira numerada, escada rolante, cerveja sem álcool e ar condicionado é o escambal! Típico do futebol corporativo dos tempos atuais. Se for pra ser assim, sou bem mais o trambolho antiquado do Morumbi. Por isso reitero a grande lema da torcida do Juventus: "Ódio eterno ao futebol moderno!".

2º Pitaco: Que outro artista pode se orgulhar de ter esse nível de composições em seu repertório?
Eight Days A Week, All My Loving, Let Me Roll It, Nineteen Hundred And Eight-Five, Blackbird, Eleanor Rigby, Band On The Run, Back In The U.S.R.R., Let It Be, Live And Let Die, Hey Jude, Day Tripper, I Saw Here Standing There, Yesterday, Helter Skelter, Golden Slumbers, Carry That Weight e The End... só para citar algumas. É muita coisa, não!?

3º Pitaco: A simpatia.
Confesso que não esperava que um artista que não precisa provar mais nada para ninguém, com grana de enriquecer gerações e mais de 70 anos nas costas, pudesse soar tão revigorante quanto diziam. Mas é verdade. Ele é bem humorado e, mesmo que o show seja milimetricamente ensaiado, a espontaneidade com que ele lida com a plateia é de verdade, basta ver os vídeos da mesma tour em outros países.

4º Pitaco: O músico.
Tem baixista mais melódico que o Macca? Além disso, ele é um guitarrista e pianista esforçado com momentos de genialidade e cantor subestimado. Sua banda também é de nível elevadíssimo. Como é bom ver isso as vezes.

5º Pitaco: A praga do disco recente é uma injustiça com Paul.
Não importa o nível das composições que o Paul venha apresentar, nada se equivale ao estardalhaço emocional provocado no público no momento em que o primeiro acorde de uma das canções dos Beatles ecoa. Nem mesmo as do Wings parecem sensibilizar com a mesma intensidade a plateia, quem dera as boas faixas do disco New (2013). Mas até ai não dá para reclamar, é normal. Até os deuses sofrem com a "maldição do trabalho novo".

6º Pitaco: O público continua mal educado.
Infelizmente, não foram só as ótimas músicas já citadas que ouvi. Escutei também palmas de senhoras em tempos que faria os caras do Meshuggah coçarem a cabeça. Mas até ai faz parte do pacote. O que me irrita é papo furado durante as músicas e "rockeirice beberrona conservadora pseudosuperior" digna de me fazer querer sair de lá correndo direto para uma balada sertaneja. Tem que ter muito saco para aguentar esse público meia-idade advogado/rockeiro.

7º Pitaco: Sir nada, é Santo mesmo.
Se começar a chover em São Paulo como no dia do show e não enfrentarmos problemas sérios com o abastecimento de água e, o mais difícil, o Palmeiras voltar a ganhar títulos, pode canonizar o Paul porque seus milagres já estão ultrapassando os limites da arte.

sábado, 22 de novembro de 2014

TEM QUE OUVIR: Weezer - Weezer (1994)

Comportados, inteligentes e de classe média. Típicos geeks antes disso tornar-se moda. O diagnostico não parecia promissor para uma banda de rock em meio a popularidade niilista do grunge, mas o resultado alcançado pelo Weezer em seu álbum de estreia é arrebatador.


Produzido por Ric Ocasek (líder do The Cars) e apelidado por motivo óbvio de Blue Album, o disco parece transitar sonoramente entre as vertentes que eclodiam na época, do pop punk do Green Day, passando pelo shoegaze do My Bloody Valentine e a acessibilidade melódica do britpop do Blur. 

A explosão melancolicamente juvenil (e em 6/8) de "My Name Is Jonas" é revigorante. Na sequência, "No One Else" soa irresistível através de um instrumental incrivelmente simples, ótimos ganchos melódicos e timbres encorpados. A balada amargurada "The Word Has Turned And Left Me Here" completa a abertura do disco com chave de ouro.

Poucos são os hits do rock 90's tão divertidos quando "Buddy Holly", que se por si só já é atrativa, fica ainda melhor através do clássico clipe dirigido pelo Spike Jonze.

Não é difícil perceber traços de Pixies na dinâmica crescente da bonita "Holiday" e, principalmente, da delirante "Undertone - The Sweater Song", dona de refrão pegajoso e guitarras barulhentas. Já a ótima balada "Say It Ain't So" agrada devido seu groove aconchegante - embora a letra trate de conflitos familiares -, além de refrão explosivo.

"Surf Wax America" (com traços do que o Blink 182 viria a fazer posteriormente) e "In The Garage" (excelentes guitarras!) completam o álbum expondo a qualidade composicional do grupo dentro de uma fórmula aparentemente simples.

Todas as faixas revelam uma visão "romântica" da vida sofrida/fracassada de um jovem nerd. O Rivers Cuomo soube compor e interpretar canções que expõem não somente a sua personalidade, mas de boa parte da sua geração. Clássico do power pop/pop punk/emo/rock alternativo 90's.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

TEM QUE OUVIR: Daniel Johnston - Hi, How Are You: The Unfinished Album (1983)

Atualmente, graças aos avanços das tecnologias, é perfeitamente possível gravar e distribuir suas músicas sem sequer sair de casa. Todavia, antes mesmo da softwares de áudio e redes sociais serem inventadas, um jovem chamado Daniel Johnston - motivado exclusivamente pelo impulso artístico que latejava em sua produtiva e enlouquecida mente -, produziu Hi, How Are You (1983), uma pérola cult.


Lo-fi e minimalista na essência, seja por limitações técnicas e/ou estética, a obra é antes de tudo uma manifestação espontânea e singela. Gravado em seu porão, com poucos recursos e muito ruído, Daniel Johnston, a beira de um colapso psicótico, transita entre Bob Dylan e Elton John, agregando valores punk (DIY) ao folk, "criando" o "mercado" alternativo/indie. 

Assim como a espetacular capa - que anos depois estamparia a camiseta do Kurt Cobain -, contendo um monstro esquisitóide e uma apresentação simpática, o disco é belo em sua inocência e dono de alta perspicácia composicional, seja através de melodias agradáveis ou de letras que fundem o nonsense com a tristeza de um coração partido. Deste modo, até mesmo o instrumental rústico, a execução falha e a voz tímida, parecem contribuir com a obra, dando ainda mais profundida emocional para as composições. Os destaques que correspondem esses valores são "Walking The Cow", "I Am A Baby (In My Universe)", "Desperate Man Blues" e "Hey Joe". 

Entre aparições na MTV, listas de melhores discos em fanzines que ninguém lê, fitas caseiras (escute a maravilhosa 1990), internações em manicômios, devaneios espirituais e auto-boicote, Daniel Johnston sobrevive através do culto de nomes como Nirvana, Pearl Jam, Sonic Youth, PJ Harvey, Beck, Yo La Tengo, Wilco e Flaming Lips. Isso definitivamente não é pouca coisa.

TEM QUE OUVIR: Gil Scott-Heron - Pieces Of A Man (1971)

Desvendar a origem de estilos musicais é uma brincadeira recorrente para quem gosta de música. No caso do rap, as especulações vão desde o cantochão e embolado até o Bob Dylan em "Like A Rolling Stone" e, mais sensatamente, Grandmaster Flash. No meio do caminho está Gil Scott-Heron que, se não criou o estilo, contribuiu diretamente através de suas composições engajadas e estilo próprio de cantar.


O discurso em prol de uma revolução racial/cultural/comportamental nos EUA, o groove facilmente sampleavel e o canto-falado de "The Revolution Will Not Be Televised", é ainda hoje impactante. Além de ser uma música fantástica por si só, não dá para desvincular a canção do que hip hop iria propor anos depois.

Entretanto, ainda que a faixa seja o suficiente para despertar a atenção para o álbum Pieces Of A Man (1971), nem de longe ela resume a qualidade do trabalho e do artista em questão. Muito pelo contrário, sendo esse o primeiro álbum de Scott-Heron em parceria com o pianista/flautista/compositor/produtor Brian Jackson, o que não falta são músicas fantásticas.

A jazzista "A Sign Of The Ages" tem melodias vocais adoráveis e passagens de piano (Brian Jackson), baixo acústico (Ron Carter) e bateria (Bernard Purdie) de genialidade absoluta. 

Mais puxada para a soul music, mas não menos sofisticada, está a brilhante "Or Down You Fall", com direito a ótimo solo de flauta.

E o que dizer da épica "The Prisioner"? Uma faixa extremamente ousada, ainda que mantendo uma adorável sensibilidade/acessibilidade melódica. Atenção para a linha de baixo.

Quem vai de encontro ao disco pelos caminhos "retrovisionados" do hip hop tem tudo para se surpreender com uma obra impecável que merece sair do limbo cult e ir direto para os clássicos da música.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

ALGO ENTRE: Gojira e Fagner

GOJIRA
Vi uma entrevista recente do Slash onde ele fala que, se por um lado o rock atual está muito básico, o metal está em seu melhor momento. Tomando bandas como o Gojira como referência, eu chego conclusão que ele está certo.

FAGNER
É maravilhosamente "brega" e popular, mas também muito bem escrito e interpretado. Não só essa música, mas o disco inteiro. No baixo, o lendário Jamil Joanes. Meu disco de fazer faxina predileto (tô falando sério).