terça-feira, 30 de abril de 2013

TEM QUE OUVIR: Public Enemy - It Takes A Nation Of Millions To Hold Us Back (1988)

No hip hop, a linha que separa a música da atitude é tênue. A postura política vem das ruas e é de fácil assimilação quando sua vida se assemelha com as de quem impiedosamente declama as letras. O rap exige o dom da comunicação elevado a níveis estratosféricos, isso sem abrir mão do conteúdo revolucionário e do talento musical herdado da música negra. Poucos grupos fizeram isso com tanta sabedoria quanto o Public Enemy, principalmente no álbum It Takes A Nation Of Millions To Hold Us Back (1988), um dos primeiros clássicos gênero, lançado pela Def Jam do Rick Rubin.


Velhos republicanos - lembrando que o disco foi lançado durante o mandato de Reagan - não compreendiam as batidas que vinham deste álbum. Todavia, a força do groove era tanta que até a Madonna - princesinha branca do pop americano -, se inspirou na sonoridade, vide "Justify My Love" que é chupinhada de "Security Of The First World".

Trazendo em sua letra um discurso do Malcom X, "Bring The Noise" é um hino do rap, conseguindo posteriormente o mesmo título no crossover, isso graças a parceria do Public Enemy com o Anthrax. Mas o peso da canção não chamou atenção apenas dos ícones do thrash metal, já que "She Watch Channel Zero?!" é o elo perfeito do rap com o rock - com direito ao riff de "Angel Of Death" do Slayer sampleado -, servindo de referência para o que grupos como o Rage Against The Machine viriam a fazer posteriormente.

A escolha dos samples é primorosa, mérito do coletivo Bomb Squad. A apropriação do funk do James Brown é sem pudor, basta observar a espetacular "Night Of The Living Baseheads".

O líder/compositor Chuck D. é um letrista furioso, sendo que seus textos ganham ainda mais força quando recebem sua voz impiedosa, vide a nervosa "Black Steel In The Hour Of Chaos". Já o figurão Flavor Flav não fica pra trás. Sua peculiaridade não se limita aos seus trajes, vide seu estilo impar de cantar em "Cold Lampin' Whith Flavor".

Dentre tantas faixas emblemáticas, "Don't Believe The Hype" não pode passar despercebida. Não por acaso a frase virou um bordão e os ruídos gritantes ao fundo do beat uma das marcas registradas do duo. Ainda hoje um clássico do estilo e uma das músicas mais conhecidas do grupo.

Político, furioso, urbano, inteligente, barulhento, grooveado e extremamente influente, o Public Enemy é o mais alto degrau do hip hop, exemplificado através dessa emblemática obra.

0016: Miles Davis - So What (1959)

Hoje é comemorado o Dia Internacional do Jazz. Pensando nisso, trago aqui um dos mais conhecidos temas/standard de todos os tempos. Falo da maravilhosa "So What", lançada por Miles Davis em seu clássico álbum Kind Of Blue (1959).

A música que abre o disco tem seu tema central executado pelo contrabaixo extremamente influente do Paul Chambers. Logo sua melodia simples vira um walk bass saboroso, que junto do piano de harmonia perfeita do Bill Evans (escrito por Gil Evans) e a bateria cheia de groove do Jimmy Cobb - com direito ao lendário ataque violento no prato aos 1:32 -, forma uma confortável cama para que Miles Davis, Cannonball Adderley e John Coltrane se entreguem em grandes improvisos, sempre melódicos, maduros e de interpretação magistral.

A complexidade dos improvisos são um contraponto a síntese do tema. É como se no meio de uma história, um toque divino mudasse o rumo para algo completamente inesperado.

Ao ouvir a faixa é impossível não perguntar se algum outro grupo já teve um time de músicos tão espetacular quanto esse? Creio que não.

A bela composição e execução primorosa de todos os envolvidos na faixa fez da música um dos grandes clássicos do gênero, sendo constantemente regrava pelos mais diversos instrumentistas, como Grant Green, Ron Carter, George Benson, dentre outros.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

TEM QUE OUVIR: Bob Marley And The Wailers - Catch A Fire (1973)

Se você tiver que escolher apenas um disco de reggae para ter em sua estante, Catch A Fire (1973) é uma boa pedida. Não que o estilo não tenha dezenas de magníficos álbuns, mas é que nenhum outro é tão representativo. 


A primeira coisa que chama atenção no trabalho é sua maravilhosa capa, que simula um isqueiro Zippo. Já em outra edição - bastante conhecida aqui no Brasil -, temos a imagem igualmente emblemática de Bob Marley fumando uma "bomba".

Assim como acontece no blues, o reggae é um estilo que prima pela interpretação emotiva, vide as ótimas passagens de "Concrete Jungle", com vocalizações soberbas do astro jamaicano.

Embora esteticamente minimalista e enxuta, a obra reúne o que de melhor há no estilo no quesito instrumentistas. Além de contar com a voz de Rita Marley e a cozinha lendária formada por Carlton Barrett (bateria) e Aston "Family Man" Barrett (baixo), Peter Tosh também da as caras e brilha como cantor e compositor, principalmente na espaçada "400 Years" e na linda "Stop The Train".

Os arranjos das canções se entrelaçam, formando uma estrutura cheia de groove. A guitarra com seu ritmo constante - embora cheio de pausa -, ajuda no balanço, enquanto o órgão de timbre doce se encarrega da harmonia. Mas o que realmente encanta são as linhas de baixo do espetacular Family Man. Neste quesito, não tem como esquecer suas clássicas frases em "Babe We've Got a Date (Rock It Baby)" e, óbvio, no hit "Stir It Up", um hino da resistência.

É necessário ainda ressaltar as letras sobre a miséria e as cicatrizes da escravidão na Jamaica, vide a imponente "Slave Driver", que caiu no mercado colonizador inglês como uma bomba.

Bob Marley é um dos grandes nomes da música mundial. Arquitetou um estilo colocando o reggae nas rádios ao redor do mundo, a Jamaica no mapa da música e a cultura rastafári em evidência, sendo Catch A Fire o despertar de sua expressão. Nasce um ícone pop do terceiro mundo.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

A decadência positiva do hard rock "farofa"

Como diria o pedante "crítico musical" Régis Tadeu, "o melhor feito do grunge foi varrer do mapa as bandas de hard rock oitentistas", comumente chamadas de hair metal ou hard farofa. Assim sendo, só deste estilo entrar em decadência, já acaba sendo o auge dele próprio e um alívio para os ouvintes mais atentos.

Obs: nem tudo é descartável no hard rock 80's. Veja meu post sobre as boas bandas deste cenário clicando aqui.

Todavia, deixando de lado essa implicância, trago aqui bons momentos desta vertente já em época decadente, onde ninguém mais dava bola. Curiosamente foi aí que esses grupos - alguns que eram verdadeiras piadas no passado, vide o Poison - lançaram bons discos. Confira os exemplos abaixo.

E fica uma provocação: ser alternativo nos anos 90 não era gostar do Mudhoney, era gostar do Ratt.

Poison
Enquanto tinha o péssimo C.C. DeVille nas guitarras, o Poison era patético. Nada funcionava. Visual, composições, execução, produção... é incrível pensar que alguém era capaz de levar aquilo a sério. Entretanto, quando o ótimo guitarrista Richie Kotzen entrou na banda em 1992 - no auge do movimento grunge - ele trouxe ótimas referências de blues-rock, country guitar e até fusion (nítido em seus solos). O disco Native Tongue (1993) não é uma maravilha, mas merece uma audição livre de preconceitos.

Skid Row
Em 1995 o Skid Row já não causava mais tanto burburinho. As meninas não se descabelavam mais pelo Sebastian Bach, preferiam agora o Eddie Vedder. Mas o Skid Row aproveitou a amizade com os integrantes do Pantera para engrossar suas músicas, vide as composições do bom Subhuman Rave (1995), com produção impecável do Bob Rock.

Mötley Crüe
O Mötley Crüe sempre foi uma boa banda, mas influenciou muito das pragas do hard rock oitentista, o que prejudicou a relevância do grupo. Além de ter o excelente baterista Tommy Lee, um dos grandes méritos está na presença do subestimado guitarrista Mick Mars. Na década de 1990, em meio a turbulências que levaram a saída do vocalista Vince Neil (aquele da voz de Pato Donald) a banda lançou o ótimo disco Mötley Crüe (1994) com o John Corabi nos vocais.

KISS
Calma! Tudo bem, eu sei que o Kiss não se enquadra diretamente no hard rock farofa, mas em alguns momentos a banda se apropriou da sonoridade do estilo, vide o superestimado Lick It Up (1983). O grupo também aproveitou a decadência do gênero para surfar na onda grunge com o bom Carnival Of Souls (1997).

sexta-feira, 19 de abril de 2013

TEM QUE OUVIR: Rainbow - Rising (1976)

Ritchie Blackmore (guitarra), Ronnie James Dio (voz) e Cozy Powell (bateria). Um disco que tem essa escalação na linha de frente definitivamente não pode passar despercebido, principalmente se tais músicos estão no auge do entrosamento. E é exatamente isso o que acontece em Rising (1976), o segundo álbum do Rainbow, dono de linda capa e produção impecável do Martin Birch.


O disco é um marco no heavy metal e hard rock. Além de apresentar composições vigorosas, a influência de música erudita está bastante presente, o que (para o bem e para o mal) deu origem ao metal neo-clássico.

As letras abordam temas medievais como batalhas, bruxaria, magia, heróis e dragões, o que faz do Rainbow um dos alicerces do metal melódico/power metal, o que também não necessariamente é algo positivo, mas concreto. 

Apesar de toda essa influência para o heavy metal, é legal perceber o groove até mesmo dançante de "Tarot Woman", faixa que abre o disco.

A voz do Dio brilha em "Run With The Wolf", canção de refrão extremamente cativante. Por sua vez, Ritchie Blackmore esbanja virtuosismo em "Starstruck", isso numa época em que desenvoltura técnica ainda estava atrelada a um propósito musical. Atenção também para a bateria precisa do Cozy Powell.

No que diz respeito ao que de melhor já foi produzido no hard rock, é difícil ignorarmos a faixa "Stargazer", que contém uma das aberturas de bateria mais emblemáticas da história. O riff de guitarra também não fica para trás. Adoro sua melodia épica, meio renascentista, interpretada com dramaticidade impressionante. O solo traz nuance "árabe". Vale dizer que a Filarmônica de Munique participa da gravação, deixando tudo ainda mais grandioso.

"A Light In The Black" fecha o disco numa paulada feroz que soa muito a frente do tempo. Tem muito do que viria a ser a NWOBHM nesta composição. Atenção para o estranho solo de sintetizador, os agudos do Dio, os arpejos guitarristicos e os bumbos duplo do Cozy Powell.

Após esse álbum, o Rainbow ainda gravaria mais um disco com o Dio nos vocais, desbancando logo depois para o Black Sabbath. Daí pra frente a qualidade da banda não foi mais a mesma. Mas ai já era tarde, eles já haviam mudado o percurso do hard rock.

sábado, 13 de abril de 2013

TEM QUE OUVIR: Simon & Garfunkel - Bookends (1968)

Existem alguns fenômenos da cultura popular que transcendem a música. Em determinado momento, a introspecção sonora fez muito mais sentido que os gritos de protestos contra a Guerra do Vietnã. Ao criar belas canções que serviram de hinos para uma geração, alguns compositores transformaram sua arte em trilha sonora de um período, tornando-os legítimos herdeiros do trovadorismo. É desta forma que vejo Simon & Garfunkel, principalmente em seu melhor e mais popular disco, Brookends (1968). 


O trabalho de Paul Simon e Art Garfunkel é calcado da música folk americana, mas adaptado ao pop contemporâneo do período. Até então, o duo já havia ganhado prestígio pela bela canção "The Sounds of Silence", lançada 4 anos antes.

Brookends representa o auge da popularidade da dupla. O disco é recheado de sucessos que levaram o álbum ao primeiro lugar. Dentre tantos hits estão a balada power pop "Mrs. Robinson" - regravada posteriormente pelo Lemonheads - e a espetacular "A Hazy Shade Of Winter".

Paul Simon é um compositor e violonista maravilhoso, vide verdadeiras pérolas que ele escreveu como "Save The Life Of My Child" - com direito a corais de música gospel -, a encantadora "America" e as lindas "Overs" e "Old Friends", essa última de arranjo grandioso.

Se Garfunkel não tem a mesma produtividade/qualidade para compor, todavia esbanja ótima e delicada voz em músicas como "Fakin' It" e "Punky's Dilema".

A epifania da dupla pode até sido o lendário show no Central Park, mas foi o espetacular repertório presente neste disco que serviu de matéria prima para toda a lenda que veio a seguir. Foi também nessa época em que a relação dos dois começou a azedar. Sucesso e conflito de egos sempre lado a lado.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Trilha sonora para sepultar Margaret Thatcher

Morreu a "Dama de Ferro" Margareth Thatcher, a ex-primeira-ministra britânica que liderou os conservadores de 1979 a 1990. Mas que raios isso tem a ver com música? Tudo, já que incontáveis pérolas musicais nasceram contra sua gestão. Sua influência indireta (ou direta?) na música é tanta que seria estranho até mesmo pensar na existência do Sex Pistols sem sua liderança direitista.


Sem mais delongas, vamos bater os pregos do seu caixão (sem comemorar, sem lamentar) ao som de verdadeiros hinos.

Morrissey - Margaret On The Guillotine
Poucas vezes o Morrissey, eterno vocalista/compositor/líder dos Smiths, foi tão certeiro numa letra. Brutal e poético.

Public Enemy - Prophets Of Rage

O grupo mais explosivo do hip hop em mais uma letra de protesto. "Mandella, cell dweller, Thatcher. You can tell her clear the way for the prophets of rage".

Dead Kennedys - Kinky Sex Makes The World Go 'Round
Nesta "bela canção", bastou um telefonema do secretario de guerra americano para Margaret ter um orgasmo.

The Specials - Maggie's Farm
O quase profético Bob Dylan levantou a bola anos antes e o The Specials chutou na direção certa.

The Exploited - Maggie
O legal do punk rock é que ele dispensa apresentações. Auto-explicativo. "Let's Start A War..." vai na mesma pegada.

Crass - How Does It Feel To Be The Mother Of A Thousand Dead?
O legal do punk rock é que ele dispensa apresentações. Auto-explicativo. [2]

The The - Heartland
O arranjo quase singelo disfarça a entonação crítica da letra. Ótima canção.

Tears For Fears - Sowing The Seeds Of Love
"Politica velha com seus grandes ideais. Você não tem ideia de como a maioria se sente?"

Pink Floyd - The Fletcher Memorial Home
Longe de estar entre as melhores músicas do Pink Floyd, a canção serve ao menos como elo perdido entre o rock progressivo e o punk rock. O lado anárquico do Roger Waters está aqui.

Elvis Costello - Tramp The Dirt Down
Elvis Costello tenta dar uma de Bob Dylan na boa letra de "Tramp The Dirt Down".

domingo, 7 de abril de 2013

TEM QUE OUVIR: The White Stripes - Elephant (2003)

De tempos em tempos, fugindo de uma crise, o rock olha para o retrovisor buscando recuperar sua magia. Equipamentos analógicos, timbres vintages, influência de blues e composições carregadas de energia fazem parte deste caldeirão que, contraditoriamente, se repete e renova o rock. No novo milênio, a banda responsável por essa oxigenação foi o White Stripes, principalmente com o lançamento do já clássico Elephant (2003).


O duo formado pelo guitarrista/vocalista/compositor/líder Jack White e pela baterista Meg White já havia despontado com bons lançamentos, mas foi neste álbum que a banda decretou relevância artística e comercial dentro do cenário musical, muito disso graças a faixa que abre o disco, a espetacular "Seven Nation Army", dona de emblemático riff, cantado até mesmo em estádios de futebol na Europa. Um clássico instantâneo.

Jack White é um grande criador. Une como poucos o blues da década de 1930 com uma displicência/atitude quase punk, vide a barulheira impressionante para uma dupla promovida em músicas como "Black Math", "Little Acorns" e o hit "The Hardest Button To Button", um perfeito garage rock feito para as massas no século XXI.

"There's No Home For You Here" tem uma dinâmica explosiva que chega ao auge em seu violento e peculiar solo. Muita dessa dinâmica se deve a encantadora/limitada/minimalista/ingênua bateria da Meg White, que encara também os vocais na detetivesca "In The Cold, Cold Night".

A linda/tristonha/sexy "I Just Don't Know What To Do With Myself" (Burt Bacharach e Hal David) soa incrível na versão da banda. Seu belíssimo clipe que conta com a presença da modelo Kate Moss colaborou para o sucesso da canção.

Completando o álbum temos a acústica "You've Got Her In Your Pocket" (que remete as composições do The Band), a longa "Ball And Biscuit" (calcada no mais rústico blues, com timbres enlouquecedores de válvula fritando), a garageira "Hypnotize" e a divertidíssima "Girl, You Have No Faith In Medicine".

Elephant é a obra-prima de uma das bandas mais relevantes deste milênio. Além disso, apresentou para o grande público o talentoso Jack White, um garimpeiro dos bons sons.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Centenário do Muddy Waters

Convenhamos, influenciar artistas/grupos como os Rolling Stones, Beatles, Chuck Berry, Bob Dylan, Jimi Hendrix, Eric Clapton, Duane Allman, Buddy Guy, Led Zeppelin, Etta James, Aerosmtih, Angus Young, Johnny Winter e até mesmo o diretor Martin Scorsese, é um feito extraordinário. E foi justamente isso que o eterno Muddy Waters conseguiu.


Muddy Waters (04/04/1913 - 30/04/1983) foi um dos grandes nomes do Blues, mais especificamente do Chicago Blues, que nada mais é que uma eletrificação da simplicidade rústica e maravilhosa do Delta Blues. Ou seja, o Blues como conhecemos hoje.

Além de ótimo compositor e espetacular cantor, suas passagens de guitarra estão entre as mais celebradas do estilo. Sua abordagem musical desencadeou nitidamente no Rock N' Roll das décadas seguintes.

Mas chega de papo, até porque isso tudo pode ser encontrado no wikipedia e, o mais importante, é conferir seus ótimos registros.

01 - Hoochie Coochie Man

02 - Baby Please Don't Go

03 - Going Down (com Johnny Winter)

quarta-feira, 3 de abril de 2013

TEM QUE OUVIR: Paulinho da Viola - Nervos de Aço (1973)

Dentre tantos elementos culturais que podem encher os brasileiros de orgulho, o samba é dos principais. O gênero é altamente popular e dono de uma produção que ressalta a sofisticação rítmica, melódica e lírica do país.

Dentre os artistas que melhor contribuem para essa exuberância estética está o Paulinho da Viola, que soube aliar elementos tradicionais do samba à modernidade. O clássico Nervos de Aço (1973) - de linda capa de autoria do Elifas Andreato e que contém arranjos de Maestro Gaya -, é uma amostra certeira desta qualidade. 


O canto doce e melancólico de Paulinho da Viola é carregado de sentimentos que dão vida a belas poesias. Suas interpretações soam tristes, quase depressivas - provavelmente herança da música do Nelson Cavaquinho -, mas também elegantes, vide as lindas "Sentimentos", "Não Quero Mais Amar A Ninguém" e a doentia/psicótica "Comprimido". 

Mas nem tudo é drama. Em "Não Leve a Mal" o sambista declara seu amor pela Portela. Já a maravilhosa "Nervos de Aço" é uma versão em homenagem a Lupicínio Rodrigues, que assim como Cartola, influenciou diretamente as composições de Paulinho da Viola. Já o experimental arranjo de "Roendo As Unhas", com melodias peculiares e solos insanos de flauta e piano, esbanjam ousadia dentro do estilo.

São poucos os letristas da música brasileira capazes de produzir pérolas como "Cidade Submersa". Ainda assim, quando não está inspirado, Paulinho da Viola recorre ao talento de gente como Wilson Batista e Chico Buarque, vide respectivamente "Nega Luzia" e "Sonho de Um Carnaval".

A linda instrumental "Choro Negro" - homenagem ao choro, gênero presente desde sua infância -, fecha esse que é um dos grandes discos da autentica música brasileira, capaz de fazer até quem não gosta de samba ficar emocionado, tamanha a qualidade das composições e interpretações.