quarta-feira, 30 de novembro de 2011

TEM QUE OUVIR: Sonic Youth - Daydream Nation (1988)

O que já era esperado se concretizou: o Sonic Youth encerrou as atividades. Na esteira da separação do casal Kim Gordon e Thurston Moore, o grupo decidiu acabar sem deixar grande expectativa de retorno.

Sempre me atraiu o fato do Sonic Youth ser igualmente amado e odiado, não tentando converter em amor este ódio. Mantiveram-se fiéis as suas características sonoras, independentemente do quão anticomerciais elas pudessem ser. O fato do grupo ter conseguido se estabelecer comercialmente e até mesmo influenciar gerações - vide Nirvana e Pavement - é no mínimo respeitável.

Para homenagear essa banda seminal do rock alternativo, dissecarei o importante Daydream Nation (1988), disco que apresentou para o mundo um estilo barulhento e nada ortodoxo, antes somente visto nos porões de Nova York.


Uma das fortes características do grupo são os ruídos latejantes e as harmonias dissonantes de guitarra, resultado de afinações e técnicas não convencionais. É possível comprovar isso com a faixa que abre o álbum, a estranhamente contagiante "Teen Age Riot".

A influência de punk rock surge na pesada "Silver Rocket", música que adianta o que seria feito anos depois pelo Kurt Cobain. Influenciados também por bandas como Velvet Underground, Television e pelo guitarrista de vanguarda Glenn Branca, o Sonic Youth extrapola os limites do campo harmônico em boas composições, dentre elas a brilhantemente arranjada "The Sprawl" e a furiosa "Cross The Breeze", essa última dona de guitarristas espetaculares.

As colagens de sons em "Eric's Trip" e "Total Trash" formam uma verdadeira parede sonora de guitarras cacofônicas, microfonias intermináveis, harmonias nada convencionais e timbres cortantes. Tudo isso vêm a se contrapor a grande parte do rock que acontecia na década de 1980, onde melodias de fácil assimilação, refrães grudentos e timbres sem ousadia ditavam os rumos da indústria fonográfica.

O esporro continua nas alucinantes "Hey Joni", "Rain King" e "Kissability", repletas de letras paranoicas. Por sua vez, "Candle" soa um pouco mais usual e melódica que as demais, ainda que carregada de dissonâncias.

As experimentações chegam ao ápice na esquizofrênica "Providence", onde qualquer semelhança com música eletroacústica não é mera coincidência. Já a épica "Trilogy" - faixa dividida em três partes e tocada em forma de suíte -, encerra o disco com tudo aquilo que caracteriza a sonoridade do grupo: boas melodias sendo coberta por ruídos, dissonâncias, ritmos retos e momentos de euforia e tensão.

Tive o prazer de assistir o último show da história do Sonic Youth. Ali ficou claro que o som do grupo é diferenciado. Diante de mim estava uma das mais ousadas e influentes bandas americanas. Gostando ou não (e eu gosto muito!) eles fizeram a diferença no rock.

domingo, 20 de novembro de 2011

Trilha sonora para o Dia da Consciência Negra

Como deixei explicito no título do post, hoje é Dia da Consciência Negra. Não vou e nem quero partir para questões políticas e sociais que envolvem o povo negro e suas lutas legítimas. Também não irei entrar no assunto de todos os estilos que os negros criaram e/ou desenvolveram diretamente. Tão pouco falarei do movimento black que aconteceu no Rio de Janeiro. Hoje o papo vai ser reto. São algumas canções que exaltam o orgulho de ser negro. Agora acomode-se (ou vá para as ruas) ao som de verdadeiras pauladas.


James Brown - Say It Loud, I'm Black & I'm Proud
Não teria como começar a lista sem essa música. O nome da canção já diz tudo (algo como: "Diga alto, eu sou preto e tenho orgulho"). O instrumental cheio de groove é de chacoalhar o esqueleto. Obra-prima da black music.

Billie Holiday - Strange Fruit
A espetacular versão da Nina Simone é talvez mais conhecida, mas a da Billie Holiday me emociona mais. As tais "frutas estranhas" que a música se refere eram os corpos dos negros linchados e expostos nas árvores em Indiana.

Nina Simone - To Be Young, Gifted And Black
Falando em Nina, não poderia esquecer essa pérola de uma das artistas que mais lutaram pelos direitos civis.

Nina Simone - Backlash Blues
Seja pela questão musical ou social, Nina Simone merece mais de uma música. Essa é uma paulada.

The O'Jays - Ship Ahoy
Trazendo na sonoplastia chicotes estalando e cordas duramente amarradas, essa canção dita o rumo épico do disco homônimo, que narra a vinda dos negros nos navios que cruzaram o Atlântico rumo a América. É a música funk/soul em de seus momentos mais progressivos e reflexivo.

B.B. King - Why I Sing The Blues
Por trás daquela doce guitarra e da personalidade divertida, B.B. King também era um cronista no racismo que sentiu na pele.

Max Roach - We Insist! (1960)
Vale lembrar que, no auge das lutas pelos direitos civis, o baterista Max Roach lançou o disco We Insist! (1960), com verdadeiras pauladas de cunho politico racial. Combativo desde a capa.

Charles Mingus - Fables Of Faubus
Seja na versão instrumental ou (mais explicitamente) na versão com letra, o que fica registrado é a inquietação de um artista que não se calou diante da politica racista do governador Orval Faubus, que impediu estudantes negros de irem a escola. 

Burning Spear - Slavery Days
Não se deixe enganar pelo som ensolarado do reggae. Essa música traz a tona o sofrimento de um povo duramente massacrado. 

Steel Pulse - Ku Klux Klan
Falando em reggae, a melhor banda do gênero de fora da Jamaica num hino de resistência. Isso numa performance calorosa. 

Public Enemy - Fight The Power
Afinal, o orgulho e a protesto devem sempre andar juntos. Clássico de uma geração via o grupo mais engajado do hip hop americano.

Wilson Simonal - Tributo a Martin Luther King
Encoberto pela sua polêmica envolvendo a ditadura militar, o engajamento politico de Wilson Simonal, principalmente com relação aos problemas raciais, foi esquecido. Um dos artistas mais populares da música brasileira.

Tim Maia - Rodésia
A base dançante quase esconde o conteúdo revolucionário da faixa, que chama o povo negro para a luta. Ótima canção.

Jorge Ben - Negro É Lindo
Uma das interpretações mais belas do Jorge Ben. Com direito a arranjo lindíssimo. Que groove, que beleza!

Dona Ivone Lara - Sorriso Negro
Falando em Jorge Ben, como esquecer dessa parceria com a gigante Dona Ivone Lara. O samba sempre proporcionando encontro históricos.

Gerson King Combo - Mandamento Black
Um verdadeiro hino. Todo o movimento black que invadiu o Rio de Janeiro na década de 1970 está representado neste post por essa obra-prima. A bateria e o baixo da música são uma aula de funk.

Rappin Hood - Sou Negrão
Nesta música temos o competente rapper Rappin Hood em parceria com a Leci Brandão em uma bela mistura de rap com samba. A letra cita vários ídolos negros da política, do esporte e das artes. A versão original feita pelo grupo Posse Mente Zulu (também do Rappin Hood) é de audição obrigatória.

Racionais MCs - Nego Drama
Já cantando por Seu Jorge e até mesmo Eduardo Suplicy, mas principalmente ecoado nas favelas de São Paulo, "Nego Grama" é um perfeito retrato da realidade em forma de música.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Os 60 anos do mestre Lanny Gordin

Um dos maiores guitarristas brasileiros (ele nasceu na China, mas sua vida/carreira foi construída no Brasil) está comemorando 60 anos. Lanny Gordin, artista que felizmente tive a oportunidade de estabelecer um contato pessoal, vai comemorar a data com o lançamento de um CD e DVD ao vivo, que contará com a participação especial de Pepeu Gomes, Luís Carlini e Edgard Scandurra. Mais informações sobre o show e sobre como ajudar o projeto vocês encontram aqui: http://mobberblog.wordpress.com/2011/10/28/mobilizacao-para-os-60-anos-de-lanny-gordin/


Para quem não conhece a carreira deste lendário músico, recomendo que escutem cada uma das canções que postarei abaixo. Seu trabalho é a comprovação de sua genialidade.

1 - Um dos primeiros trabalhos do Lanny Gordin foi com artistas da Jovem Guarda, dentre eles Silvinha Araújo e Wanderlea. Uma das gravações mais interessantes de Lanny neste período foi com Eduardo Araújo. A guitarra carregada de fuzz era uma novidade no Brasil e o Lanny Gordin aplicou muito bem o efeito em uma música bastante pesada para a época (1968). Detalhe para o berro de Eduardo Araújo que antecede o riff. "Mister Lanny" quebra tudo!

2 - Mesmo que tenha começado a se destacar com artistas da Jovem Guarda, Lanny Gordin já era conhecido ainda adolescente por tocar na famosa boate de seu pai, a Stardust, localizada em São Paulo. Por essa boate passaram músicos como Heraldo do Monte e Hermeto Pascoal, sendo que foi com esse último que Lanny Gordin montou o Brazilian Octopus, grupo que continha o também guitarrista Olmir Stocker (Alemão).

3 - A carreira de Lanny Gordin subiu outros patamares quando ele começou a tocar com artistas da Tropicália. Lanny foi responsável em grande parte pela sonoridade rockeira e psicodélica do movimento, sendo reconhecido como o mais talentoso guitarrista do Brasil por ícones como o maestro Rogério Duprat. Dentre todos os discos que Lanny gravou na Tropicália, os prediletos dos guitarristas são os com a Gal Costa, principalmente por serem os mais psicodélicos e experimentais.

4 - Lanny acompanhou os artistas tropicalistas também fora do Brasil. Um dos vídeos mais interessantes que estão no YouTube é o dele tocando com Gilberto Gil e Caetano Veloso logo quando eles voltaram do exílio. Acho imprescindível a audição do Álbum Branco (1969) do Caetano e Expresso 2222 (1972) do Gilberto Gil para entender melhor a música brasileira e o trabalho do Lanny Gordin.

5 - De todos os discos gravados por Lanny (e não são poucos) o meu predileto é o autointitulado álbum de estreia do Jards Macalé, lançado em 1972. Nele há canções geniais, harmonias intrigantes e arranjos fantásticos, executados apenas com bateria (tocada pelo espetacular Tutty Moreno), violão e baixo (que Lanny também tocou). 


6 - Ainda na década de 70, Lanny Gordin tocou com Rita Lee (no bom disco Build Up), Erasmo Carlos (no clássico Carlos, Erasmo), Tim Maia (a guitarra de "Chocolate" é dele), Antônio Carlos & Jocáfi (a guitarra de "Kabaluerê" não poderia ter outro dono), além de ter acompanhado ao vivo Tom Zé, Jair Rodrigues e Elis Regina.

7 - Infelizmente, do final da década de 70 até o final da década de 90, Lanny Gordin viveu praticamente no ostracismo, isso porque passou por problemas mentais relacionados ao abuso de LSD, chegando a ser internado 4 vezes em sanatório e desenvolvendo esquizofrenia. Ainda sim é possível ouvir sua guitarra em trabalhos com o Aguilar e a Banda Performática, Catalau, Itamar Assumpção, Chico César e Vange Milliet. Sua volta por cima aconteceu definitivamente com a ajuda do Luis Calanca, dono da Baratos Afins, que gravou e lançou um disco solo de Lanny em 2001. O trabalho desencadeou no Projeto Alpha e mais recentemente no grupo Kaoll. Lanny também lançou em 2007 um disco chamado Duos, que contém a participação de todos os grandes ícones da Tropicália (Gal, Gil, Caetano, Macalé) e seus fãs da nova geração, dentre eles Zeca Baleiro, Fernanda Takai, Adriana Calcanhoto, Max de Castro e Rodrigo Amarante. Neste período é interessante notar que Lanny praticamente abandonou o fuzz e mergulho de vez em harmonia complexas, solos free e sonoridade contemporânea.

Ao conhecer pessoalmente o Lanny Gordin percebi que ele é ainda maior que sua música, sendo um sujeito de coração doce e que, apesar de toda dificuldade, transmite alegria e conhecimento para todos que o rodeiam. Por isso Lanny é um mestre, mas não apenas da música, mas também da vida. Parabéns, Lanny. Vida longa!

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

TEM QUE OUVIR: Pearl Jam - Ten (1991)

É plausível entender o movimento grunge como restrito a um período, já que muitas bandas ficaram no passado. A exceção talvez seja o Pearl Jam, que sobrevive lotando estádios, lançando discos e comprando brigas na indústria da música. Mas essa força tem como origem o Ten (1991), álbum de estreia do grupo, que chamou atenção logo quando lançado, chegando a vender mais que qualquer outro disco das bandas de Seattle, incluindo o Nevermind do Nirvana.


É interessante notar que, se o Alice In Chains tinha o som bastante calcado no heavy metal e o Nirvana no punk rock, o Pearl Jam se aproximava mais do hard rock. Isso se explica no fato do grupo ter sido formado nos vestígios do Mother Love Bone, grupo atuante da região que terminou com a morte prematura de seu vocalista, o Andrew Wood. Musicalmente, o riff da ótima faixa "Once" já entrega esse tendência hard.

Assim como em outras bandas grunge, o vocalista é peça fundamental para formular o conceito e a imagem do grupo. No Pearl Jam, Eddie Vedder fez isso com primor, como fica claro nos vocais e na letra dramática do hit "Alive". Destaque também para o solo melódico de Mike McCready, que com seus timbres cortantes constrói momentos de grande qualidade guitarristica. Isso pode ser percebido também em "Even Flow", um dos hinos daquela geração, dona de riff e refrão pegajoso.

Tecnicamente, o músico de maior destaque é o baixista Jeff Ament, ora de forma pesada ("Why Go"), ora com sensibilidade e senso melódico incrível ("Black"). No entanto, seu melhor desempenho está na introdução de "Jeremy", gravada com um incrível baixo de 12 cordas. O clipe paranoico da música teve grande rotação na MTV, contribuindo para o sucesso da banda.

Jeff Ament ataca seu baixo fretless na acústica e "zeppelina" (os violões são total Jimmy Page) "Oceans". Na sequência temos "Porch", música com solo extremamente simples e melódico, característica que o grunge trouxe para década de 1990, sepultando a virtuosidade gratuita do hair metal.

Já as letras tipicamente desiludidas e melancólicas do grunge aparecem na ótima balada "Garden" e na esquizofrênica "Deep", mais uma vez repleta de ótimas guitarras.

A longa "Release" encerra o disco da mesma forma que começou, com ritmos tribais, guitarras ruidosas, sussurros de Eddie Vedder e linha de baixo minimalista. Sem dúvida um álbum essencial que abriu as portas mercadológicas para uma nova e excelente safra de bandas, e também para as famigeradas camisas de flanela.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

TOP 5: New Metal (Nu Metal)

Se tem uma vertente musical dentro do rock que é avacalhada injustamente é o new metal. Também conhecido como nu metal, o estilo incorpora o peso do thrash metal (vide Sepultura) com as letras desiludidas do grunge (vide Alice In Chains) e, algumas vezes, elementos do hip hop, como o canto falado, beat retos e a presença de DJs. Afinações baixas e dissonâncias também fazem parte da estética. Sem mais delongas, citarei aqui algumas bandas legais do estilo.

1 - Korn
O Korn é um dos precursores do estilo, sendo que o sucesso deles desencadeou em outras centenas de bandas com a mesma sonoridade. O grupo teve durante muito tempo como base os guitarristas Munky e Head, sendo que ambos construíam arranjos extremamente interessantes com intervalos dissonantes e peso típico das guitarras de 7 cordas. Além disso, a banda tem como membro o ótimo vocalista Jonathan Davis e o bom baixista Fieldy, que tem como característica extrair ritmos e timbres peculiares de seu instrumento.

2 - Deftones
Acho interessante notar que a maioria das bandas de new metal caíram no esquecimento e deixaram de produzir discos relevante, com exceção do Deftones. Mesmo com os problemas internos relacionados ao acidente do baixista Chi Cheng em 2008, a banda não deixou de produzir bons trabalhos, sendo que os dois últimos de produção ultra caprichada. A minha banda predileta do estilo, principalmente por juntar o peso das guitarras de 7 cordas com elementos melódicos herdados do trip hop. 

3 - Slipknot
Eu já disse pejorativamente inúmeras vezes e volto a dizer: "Os 20 malucos dos Slipknot não conseguem o peso dos três do Krisiun". Todavia, a banda tem músicas que mesclam brutalidade com boas melodias de maneira muito coerente. Além disso, por mais caricata que possa ser as máscaras que os integrantes usam, a ideia marketeira funciona muito bem, principalmente ao vivo.

4 - System Of A Down
Essa excelente banda ainda não lançou um único disco sequer ruim. O guitarrista Daron Malakian é uma máquina de riffs e o vocalista Serj Tankian tem um estilo de cantar que lembra muito o Frank Zappa (tanto fisicamente quanto "timbristicamente/melodicamente"). A mistura de metal com música folclórica da Armênia é ao mesmo tempo estranha, divertida e encantadora. Grande banda!

5 - Incubus
No meu modo de ver, Disturbed, Mudvayne, Helmet e Incubus são bandas bem legais, mas não são propriamente new metal. Todavia, como todas elas são chamadas de new metal e eu gosto muito de Incubus e não consigo pensar em nada melhor, deixarei eles aqui no ranking.