quinta-feira, 30 de junho de 2011

TEM QUE OUVIR: Pantera - Vulgar Display Of Power (1992)

É indiscutível que o heavy metal viveu seu grande apogeu na década de 1980. Mas o estilo, mesmo quando demonstrou sinais de saturação criativa, não deixou de se desenvolver. Um exemplo disso é o Pantera, que lançou o acachapante Vulgar Display Of Power no inicio da década seguinte.


Se o trabalho anterior - Cowboys From Hell (1990) -, foi o responsável por levar o Pantera de um hard rock farofento para seu poderoso thrash metal, Vulgar Display Of Power trouxe para a banda uma produção ainda mais potente, riffs ultra pesados e um groove que nenhum outro grupo de metal tinha conseguido até então. Méritos conquistados com a ajuda do produtor Terry Date.

A infernal "Mouth For War" abre o disco apontando as novas direções da banda: riffs pesados e vocais rasgados (quase guturais). Já a faixa seguinte é um verdadeiro soco na cara (a capa do disco não é assim por acaso): "A New Level" equilibra o peso do thrash metal com a cadência amaldiçoada do doom. Esta música define o que é o rótulo de groove metal que a banda recebeu nos EUA.

Na sequência temos a mais famosa música do Pantera, a simples e contagiante "Walk", canção responsável por popularizar o grupo. Outra faixa famosa, principalmente devido a grande rotação na MTV, é "This Love", em que Phil Anselmo demonstra toda sua versatilidade ao equilibrar vocais melódicos e berrados.

"Fucking Hostile" é um hardcore entorpecido de vocais rasgados e bumbos disparados em velocidade frenética. Essas características se mantém em "Rise", sendo que aqui a sincronia entre bateria, guitarra e baixo beira o absurdo. O groove do Pantera volta a chamar atenção no riff de "No Good (Attack The Radical)". A bateria e a guitarra da música só poderia ter sido tocada por irmãos, tamanha a "cola" entre os instrumentos.

"Live In A Hole" começa com uma introdução paranoica e esquizofrênica do Dimebag Darrell. É interessante notar a ausência de uma guitarra base na hora do solo, sendo somente o baixo de Rex Brown responsável por fazer a "cama" estrutural da música.

Riffs demolidores voltam a chamar atenção em "Regular People (Conceit)", assim como a excelência de Anselmo ao colocar seus vocais ríspidos e melódicos numa mesma música. Nesta faixa o solo de guitarra soa progressivo, experimental e repleto de harmônicos agonizantes.

"By Demons Be Driven" tem uma das melhores baterias de Vinnie Paul, que somada a intervalos dissonantes de guitarra, soa como uma metralhadora fuzilando o interior da cabeça do ouvinte. É interessante perceber que mesmo sendo ultra pesada, ela tem fortes características do southern rock nas frases de guitarra.

O disco fecha com a balada "Hollow", bem mais tranquila que o restante do disco, repleto de guitarras dobradas, violões e uma linha vocal ultra melódica. Ainda assim, o peso característico da banda aparece na metade final da música, mostrando que, mesmo na hora de compor baladas, eles não perdiam a potência sonora.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

As diferentes "MKs" do Deep Purple

Hoje é aniversário do meu baterista predileto, o subestimado Ian Paice. O músico que já passou pelo Whitesnake, pela banda do Gary Moore e até mesmo gravou um disco esquecido do Velvet Underground, escreveu definitivamente seu nome na história do rock através do Deep Purple. Com 63 anos comemorados hoje, ele é o único integrante do quinteto que tocou em todas as formações nesses 43 anos de banda, sequer perdendo um único show.


Para homenageá-lo, dissecarei brevemente todas as fases do Deep Purple. É importante lembrar que as formações do grupo são comumente chamadas de Mark (ou MK). Outro fator que merece atenção é o hiato de oito anos que o grupo teve entre 1976 e 1984.

Mesmo com diversas formações, o Deep Purple sempre manteve a característica de ter cinco integrantes: vocalista, baixista, guitarrista, tecladista e baterista. Respeitando essa escalação (e não necessariamente a ordem de cada instrumentista na foto abaixo), citarei o nome dos músicos que fizeram parte de cada MK.

1 - MK I (1968 - 1969) - Rod Evans, Nick Simper, Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice.
Ao contrário de muitos grupos de rock, o Deep Purple não é uma banda formada por jovens amigos que se conheceram no colégio ou faculdade. A primeira formação é cheia de músicos experientes, que já tinham passado por diversas bandas e trabalhado como músicos de estúdio. Apesar desta "experiência", o MK I não apresenta grandes novidades dentro da música que ocorria na época. O som da banda é marcado pela mistura de rock inglês com pitadas progressivas. Mesmo com três discos lançados repletos de canções autorais, as músicas mais interessantes desta fase são suas versões, dentre elas o hit "Hush".

2 - MK II (1969 - 1973) - Ian Gillan, Roger Glover, Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice
Percebendo que o som do grupo necessitava de mais peso, Rod Evans e Nick Simper foram chutados da banda. No lugar deles entraram Ian Gillan e Roger Glover, respectivamente. Esta fase estreou com um projeto audacioso, o Concerto for Group & Orchestra. Com o Led Zeppelin estourando e o Deep Purple não alcançando grandes picos, reformularam o conceito da banda e lançaram o pesado In Rock. Dai pra frente foi uma sequência avassaladora de discos espetaculares, fazendo desta a formação "clássica" da banda, muito disso por conta do disco Machine Head, que contêm o hit "Smoke On The Water". Uma música que define bem esta nova fase do grupo é a pesada e entorpecida "Speed King", que abre o disco In Rock.

3 - MK III (1973 - 1975) - David Coverdale, Glenn Hughes, Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice
Não é segredo pra ninguém que Blackmore é um dos músicos mais chatos do rock e que isso gerou inúmeros atritos com o Gillan. Mas apesar desta chatice, quando o clima ferveu para além do normal, foi Gillan que levou a pior e, de quebra, atingiu seu melhor amigo (Roger Glover), que também debandou do grupo. Nos seus respectivos lugares entraram David Coverdale e Glenn Hughes, que deram um novo gás para o quinteto, culminado em discos emblemáticos como Burn e o funkeado Stormbringer. Uma volta do MK III é tida como um sonho por grande parte dos fãs, sendo que o grande empecilho para isso é o fato de Ian Paice fazer parte da formação atual do Deep Purple.

4 - MK IV (1975 - 1976) - David Coverdale, Glenn Hughes, Tommy Bolin, Jon Lord e Ian Paice
Apesar do clima aparentemente melhor dentro da banda, a parte musical começou desinteressar Blackmore, já que segundo ele a banda começava a ficar "funk demais". A prova de que ele estava certo veio com o subestimado disco Come Taste The Band, que recrutava o excelente guitarrista Tommy Bolin. Apesar das ótimas composições, a formação ultra desfalcada incomodou o público. Resultado: o disco não foi bem aceito. Pra piorar, Glenn Hughes e Tommy Bolin tinham mais heroína na veia do que sangue, fazendo com que as apresentações do grupo soassem patéticas. Todo esse caos levou ao fim do grupo em 1976 e a morte prematura do guitarrista meses depois.

5 - MK II (1984 - 1989) - Ian Gillan, Roger Glover, Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice
Após 11 anos em repouso, com a conta no vermelho e saudade das velhas brigas, a formação clássica da banda (MK II) voltou para lançar um novo disco de estúdio. Batizado de Perfect Stranger, o trabalho apresenta boas canções e produção ultra polida. Os show desta época se tornaram intensos, mas a tranquilidade durou apenas até o fracasso do disco seguinte, o fraco The House Of Blue Light. Assista o clipe de "Perfect Stranger" e veja o hilário momento em que Blackmore recusa o aperto de mão de Gillan. Apenas uma brincadeira? A história mostra que não.

6 - MK V (1989 - 1991) - Joe Lynn Turner, Roger Glover, Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice
Gillan abandona o grupo novamente, só que desta vez, deixa uma praga dentro da banda. Só só isso explica a ruindade desta fase. Joe Lynn Turner conseguiu trazer tudo de mais chato que ele fez com o Rainbow para dentro do Deep Purple, o resultado foi o péssimo disco Slaves and Masters. É AOR dos piores. Foi com essa formação que a banda veio pela primeira vez ao Brasil, sendo a única com o Blackmore na formação.

7 - MK II (1992 - 1994) - Ian Gillan, Roger Glover, Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice
O período de Blackmore dentro do Deep Purple estava chegando ao fim, mas pra fechar o ciclo com chave de ouro, Ian Gillan voltou para a banda. Após o lançamento do bom The Battle Rages On, o grupo saiu em turnê e os problemas novamente apareceram (novamente entre Gillan e Blackmore), levando o gruitarrista para fora do Deep Purple. O clima péssimo dentro do grupo pode ser conferido no DVD Come Hell Or High Water. Desde então, a banda nunca mais tocou com sua formação clássica.

8 - MK VI (1994) - Ian Gillan, Roger Glover, Joe Satriani, Jon Lord e Ian Paice
Apesar de curta, esta fase foi de grande importância para banda, pois trouxe a alegria e a vontade de tocar novamente para dentro do grupo. Joe Satriani não quis permanecer no Deep Purple por achar a responsabilidade de substituir Blackmore grande demais. Ainda assim, fez importantes shows com o quinteto.

9 - MK VII (1994 - 2002) - Ian Gillan, Roger Glover, Steve Morse, Jon Lord e Ian Paice
Com a não permanência de Joe Satriani, o Deep Purple correu atrás de um outro grande virtuose, mas desta vez encontrou a peça perfeita, o espetacular e sorridente Steve Morse. Esta formação duradoura lançou o ótimo Purpendicular e fez shows pelo mundo inteiro. Um grande momento da banda foi quando eles refizeram o Concerto for Group & Orchestra, chegando até mesmo a trazer essa tour para o Brasil.

10MK VII (2002 - atualmente) - Ian Gillan, Roger Glover, Steve Morse, Don Airey e Ian Paice
Infelizmente, a idade chegou para Jon Lord e em 2002 ele decidiu deixar a banda (ao menos desta vez, tudo aconteceu sem nenhum conflito). Para o lugar dele veio Don Airey, responsável dentre outras coisas pelo lendário teclado de "Mr. Crowley" do Ozzy. Apesar da banda continuar na ativa fazendo grandes shows e lançando discos irregulares, boa parte da magia do Deep Purple foi embora com Jon Lord. Ainda assim, é sempre legal assistir o show deles, embora a voz do Gillan apresente falhas. Infelizmente ou felizmente, é o que dá pra ter.

É isso, uma carreira marcada por altos e baixos, mas que acima de tudo merece muito respeito. Parabéns ao Deep Purple. Parabéns ao aniversariante Ian Paice.

domingo, 26 de junho de 2011

A Parada Gay na música

Apesar de estarmos no século XXI, existem alguns problemas que a humanidade ainda não superou. Dentre tantos está o preconceito. 

Barreiras impostas por políticas reacionárias e doutrinas religiosas servem de combustível para o desrespeito com pessoas que vivem diferente do que propõem os "moralistas em defesa da família e propriedade".

Hoje é dia de um evento muito importante para a sociedade: a Parada Gay. Pesando nisso, venho aqui lembrar o trabalho de alguns artistas LGBTQ+. Eles não são melhores nem piores por conta de suas opções sexuais, apenas merecem o reconhecimento que conquistaram. Esse post é uma pequena homenagem pela coragem que tiveram e barreiras que quebraram. Vale ainda refletir a interferência (se existente) dessa questão pessoal em suas respectivas obras.

Little Richard
Como se não bastasse ser negro e pobre numa América terrivelmente opressora, Little Richard é também homossexual. Um transgressor comportamental. Isso é rock n' roll.

Billy Strayhorn
Parceiro histórico do Duke Ellington, esse brilhante compositor, arranjador e pianista foi peça fundamental no sucesso artístico do Duke. Na época, chegaram a cogitar que eles tinham um caso, o que nunca foi comprovado.

Wendy Carlos
Nascido Walter Carlos, o importante músico é um dos exemplos de troca de sexo no mundo da música (David Palmer, ex-tecladista do Jethro Tull é outro exemplo). Wendy é uma das mais importantes compositoras do século XX. Suas experimentações eletrônicas a levaram para a concepção e produção da trilha sonora do filme Laranja Mecânica. Além de músicas originais, a trilha traz também um importante trabalho de releitura para peças eruditas. É interessante notar que Wendy é creditada no filme como Walter, já que o filme foi feito antes da sua transição.

Freddie Mercury
Quando pensamos em algum homossexual do mundo da música, Freddie Mercury é dos primeiros que vem em mente. O eterno líder do Queen foi um ótimo vocalista, pianista e compositor, além de um farol em cima dos palcos. Com voz e postura imponente, era capaz de levar a plateia em suas mãos.

Dave Davies
Assumidamente gay, o espetacular guitarrista do Kinks tem inclusive uma composição (o hit "Lola") que narra uma história "constrangedora" com um travesti. Tem quem ache transfóbica, o que pode fazer sentido, mas também mostra o quão essa acusação pode atingir as pessoas erradas.

Lou Reed
Além de ter morado com uma travesti, ninguém cantou sobre esse mundo melhor que Lou Reed. Isso numa época em que o tema era um tabu. Ruptura natural para um dos grandes letristas da história.

Elton John
Figura ultra carismática, de talento musical gritante. Tem que não desvincule seu brilho de sua orientação sexual, o que de certa forma é uma visão antiquada.

Rob Halford 
A homossexualidade de Rob Halford já foi "piada" entre os fãs de heavy metal. Felizmente isso tem caído por terra. Além de ser umas das figuras mais importantes e respeitadas do metal, ele foi capaz de influenciar muita gente não só com sua voz, mas também pelas suas roupas de couro cheias de rebites e tachinhas compradas em sex shop. É a estética definitiva do gênero. Sua "saída do armário" levou outros músicos de heavy metal a fazer o mesmo, vide o ex-Gorgoroth, Gaahl. 

Limp Wrist
Banda de hardcore militante no movimente LGBT. Dai saiu o que ficou conhecido como Queercore. Extremamente recomendada pra quem curte punk/hardcore. É espetacular!

Big John Duncan
Ainda no cenário punk/hardcore, vale lembrar deste lendário guitarrista do The Exploited, que posteriormente ainda ficou conhecido por trabalhar de roadie para bandas como Nirvana, Ministry e Foo Fighters. 

Boy George
Não há nada que ainda não foi dito sobre a aparência transvestida do Boy George. O que ficou para escanteio nessa história é que o Culture Club tem canções bem bacanas.

George Michael
George Michael reúne todos atributos que os homofóbicos "valentões" odeiam: é aquele típico gay expansivo, artisticamente talentoso e que faz (ou fazia) muito sucesso com a mulherada. Mas por mais que ele tentasse (a pressão da industrial é cruel), não teve como esconder sua orientação sexual. Até sua música é "tipicamente gay". E não por nada não, mas se você falar que essa música é ruim você tá equivocado. É pop dos bons.

Mykki Blanco
E hip hop feito por um performista, hein! Não consigo encontrar outra palavra pra descrever que não seja "atitude". E o som é bem bom.

Johnny Alf
Gênio subestimado da bossa nova. Até onde sei, nunca assumiu a homossexualidade publicamente, embora não fosse segredo entre os que o conhecia. Ainda assim, isso contribuiu para sua personalidade reservada. 

Ney Matogrosso
No Brasil temos vários exemplos de cantores gays: Renato Russo, Cazuza e até mesmo o contratenor Edson Cordeiro. Mas o que apresenta o trabalho musical mais interessante é mesmo o Ney Matogrosso, principalmente quando ainda era um jovem cantor projetado pelo excelente grupo Secos & Molhados. Apesar de Ney não ser o líder do grupo como muitos pensam - João Ricardo era o verdadeiro líder da banda -, sua presença de palco somada a potente/única voz acabou se sobressaindo aos demais companheiros de banda.

Cássia Eller
Honestamente, não me vem em mente muitas mulheres homossexuais do mundo da música. A maioria que lembro são projetos de cantoras de uma MPB xarope. Mas tem uma que foge desta tendência: Cássia Eller. Ela transitava entre o samba e o rock com uma facilidade/atitude espantosa.

Textículos de Mary
Quer um exemplo da discriminação que os gays sofrem? É só ler a história do Texticulos de Mary e ver o boicote que a banda sofreu por parte do público conservador e de empresas que não queriam a banda em festivais que patrocinavam. O som? Uma mistura absurda de punk rock com glam.

Tchaikovsky
E por fim, mas não menos importante, vale dizer que há uma lenda envolto a sexualidade do Tchaikovsky, compositor russo de verdadeiras obras-primas do balé. Dizem que sua personalidade angustiante era fruto de uma repressão do estado contra o fato de ser homossexual. 

É legal citar também bandas/artistas que flertaram de alguma forma com a androginia, homossexualidade, transexualidade ou qualquer coisa do tipo, mesmo não sendo propriamente gays: David Bowie, Mick Jagger, T. Rex, New York Dolls, Iggy Pop, Brian Eno, Bryan Ferry, Pete Burns, Genesis Breyer P-Orridge, Soft Cell, The Smiths, Prince, Twisted Sister, Mötley Crüe, Suede, Lady Gaga, Caetano Veloso, Made In Brazil, Edy Star, Serguei, Mirian Batucada, Maria Alcina, Agnaldo Timóteo, dentre outros.

Tá ai, um post repleto de gigantes da música que deixam muito metido a machão com cara de bunda.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Mistura inusitada de estilos

Se tem algo que tira a paciência de muito artista é o maldito rótulo. Segmentar estilos é natural para a indústria fonográfica, mas algo de impacto ocorre ao misturar vertentes musicais que ficam separadas nas prateleiras das lojas de disco. 

É disso que venho falar hoje, bandas/artistas que abusaram de gêneros distantes para moldar o próprio som. Obviamente isso é mais comum do que se parece. O próprio rock n'roll nasceu de uma fusão de estilo (principalmente blues com a música country). Ainda assim, tal tema vale a brincadeira.


Rock + Música Erudita = Deep Purple
A ideia de uma banda de rock tocar com orquestra hoje em dia parece comum. Metallica, Dream Theater, Kiss e até mesmo Manowar já fizeram isso, mas a ousadia do Deep Purple foi maior. Ainda no final da década de 1960 eles não só tocaram com orquestra, mas trabalharam em novas composições para executar neste formato (banda e orquestra). A fase MK II (Gillan, Blackmore, Lord, Glover, Paice) ainda não havia lançado nenhum disco de estúdio, ou seja, o projeto tinha tudo pra dar errado, mas apesar de não ter obtido grande sucesso comercial, é visto com carinho pelos fãs.

Samba + Rock = Jorge Ben
Apesar do rótulo samba-rock ser um tanto quanto tosco, a verdade é que o Jorge Ben fundiu muito bem os dois estilos, vide por exemplo o gingado psicodélico de "Errare Humanum Est". Atente-se a letra lisérgica da canção e ao seu violão ritmicamente único. 

Rap + Jazz = Gang Starr
Se analisarmos friamente a história da música, veremos que o rap e o jazz tem muita coisa em comum, como por exemplo o fato de serem representados em sua maioria e excelência por músicos americanos, negros e pobres. Mas se analisarmos a estrutura musical dos dois estilos encontraremos poucas semelhanças, ainda assim, Guru e Dj Premier se uniram pra colocar em prática a ideia ambiciosa de fazer rimas inteligentes em cima de beats de jazz. O resultado pode ser conferido abaixo na ótima "Jazz Thing". O duo fez escola, sendo ainda hoje uma fusão de excelentes resultados.

Jazz + Rock = Miles Davis
O mundo da música entrou em choque no final dos anos 60 com o surgimento de Jimi Hendrix. Apesar do lendário guitarrista não ter o fraseado do jazz, suas improvisações chamaram a atenção de mestres do estilo, dentre eles Miles Davis. Aficionado pela potência do som de Hendrix e o groove Sly And The Family Stone, Miles reformulou seu estilo, chegando ao ponto de usar wah-wah em seu trompete. Para deixar seu som ainda mais pesado, convidou outros músicos para se juntar a sua banda, dentre eles o pianista Herbie Hancock, o guitarrista John McLaughlin e o percussionista brasileiro Airto Moreira. Esta mistura de jazz com rock proposta por Miles Davis no disco Bitches Brew deu origem a um novo estilo chamado fusion.

Blues + Música Eletrônica + Rap = Nuno Mindelis
Imagine agora a mistura de um estilo triste e orgânico como o blues com uma vertente dançante e aliada da tecnologia como a música eletrônica. É isso que o excelente guitarrista Nuno Mindelis tem trabalhado em seus últimos discos, principalmente no Outros Nunos (2005). A prova de que a música dele não tem limites é a participação do rapper Rappin Hood na boa "Tenho Medo".

Heavy Metal + Moda de Viola = Ricardo Vignini e Zé Helder
Apesar de não terem criado um repertório novo, Ricardo Vignini e Zé Helder (integrantes do curioso Matuto Moderno) estão com um projeto bastante interessante que consiste em fazer versões para clássicos do heavy metal na viola caipira. Escute a incrível versão que eles fizeram para "Master Of Puppets" do Metallica e tirem suas próprias conclusões.

Punk Rock + Reggae = The Police
A Inglaterra no final dos anos 70 estava tomada pelo espírito punk, mas havia três garotos que não se identificavam com toda aquela displicência técnica e estavam mais ligados no som feito do outro lado do Atlântico, mais precisamente na colônia Jamaica: o reggae. A banda em questão é o The Police, que apesar de não aprovarem o punk, incluíram a simplicidade e o peso do estilo para deixar o reggae da banda mais vitaminado. Um disco que mostra essa mistura com propriedade é o espetacular Reggatta de Blanc (Reggae de Branco). Escute a ótima faixa título e comprove a excelência da banda.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Tapping antes de Eddie Van Halen

Eddie Van Halen tornou-se um dos guitarristas mais influentes de todos os tempos assim que o primeiro disco do Van Halen foi lançado em 1977. Dentre tantas músicas excelentes, uma em especial chamou a atenção dos guitarristas. Falo de "Eruption", faixa esta instrumental, com menos de 2 minutos, que traz EVH apresentando sua "nova" abordagem técnica.


O tapping consiste em usar as duas mãos na escala do instrumento (no braço da guitarra), ou seja, ao invés de palhetar as notas, elas são "marteladas" e ligadas umas as outras, dando a possibilidade de tocar em alta velocidade intervalos melódicos de grande tessitura em uma mesma corda. Para ilustrar melhor a técnica, assista Eddie Van Halen tocando "Eruption" em uma apresentação ao vivo (a passagem que ocorre aos 1:05 definiu o que hoje conhecemos como tapping):


Com esta técnica, Eddie Van Halen trouxe para guitarra novos horizontes e influenciou uma geração de guitarristas, dentre eles, Randy Rhoads, Joe Satriani, Steve Vai, George Lynch, Kiko Loureiro, Jeff Watson e Stanley Jordan, sendo que os dois últimos elevaram o tapping para novos limites.

Mas apesar da genialidade indiscutível de Eddie Van Halen, ele não foi criador desta técnica. É conhecida a história de que Niccolò Paganini já havia abordado o mesmo conceito em seu violino. Roy Smeck, o mais famoso tocador de ukelele, também já havia usado o tapping em seu instrumento. Violonistas eruditos como Julian Bream e guitarristas de jazz como Barney Kessel também foram vistos aplicando a famosa técnica. Ainda sim, coube a Eddie Van Halen popularizar esta ferramenta a serviço da música pop.

Todavia, postarei alguns registros de grandes guitarrista usando a técnica de tapping antes do surgimento do Van Halen. O intuito não é desmerecer de maneira alguma as qualidades de EVH, mas sim, apresentar passagens de guitarras que foram esquecidas durante o tempo.

Obs: Ace Frehley (Kiss), Ted Turner (Wishbone Ash), Leslie West (Mountain), Jeff Beck e até mesmo Paulinho Nogueira costumavam usar a técnica em seus solos ao vivo, mas desconheço a aplicação do tapping em seus discos. Se alguém souber de alguma música coloque nos comentários.

Genesis (Steve Hackett) - The Return Of The Giant Hogweed
Apesar de não apresentar a velocidade das frases de Eddie Van Halen, esta introdução com tapping foi responsável por introduzir a técnica ao Rock. É possível que Steve Hackett tenha visto a técnica sendo usada por algum violonista erudito, como o já citado Julian Bream, mas nada tira o mérito de sua ousadia e ótima interpretação.

ZZ Top (Billy Gibbons) - Beer Drinkers and Hell Raisers
Billy Gibbons, possivelmente após um bebedeira, aplicou o tapping neste clássico do southern rock. As passagens são sutis, mas apresentam cores atraentes para o solo em vários momentos. Atente-se ao tempo de 2:37 para não deixar umas das passagens passar despercebida. 

Queen (Brian May) - It's Late
Brian May disse em uma entrevista para a Guitar Player que decidiu explorar a técnica após ver um músico aplica-la enquanto tocava em um pequeno bar no Texas. Quando perguntou ao tal músico de onde ele tinha tirado a ideia para aquilo, a resposta veio direta: "Peguei do Billy Gibbons". Brian May disse também que adorou o resultado final do solo de "It's Late", mas que achava muito difícil executar a técnica ao vivo, então abandonou a ideia.

Frank Zappa - Inca Roads
Compositor de vanguarda e guitarrista virtuoso em seu modo peculiar de tocar, Frank Zappa encontrou no tapping um diferente colorido para suas melodias improvisadas. Nos compassos finais do solo de "Inca Roads" a técnica fica explicita.

Harvey Mandel - Fish Walk
Apesar de ser citado por muitos (Ritchie Blackmore, por exemplo) como o primeiro guitarrista de Rock/Fusion a usar o tapping, a carreira de Harvey Mandel nunca obteve grande sucesso. Ainda sim, era admirado por tantos músicos que por pouco não entrou para os Rolling Stones no lugar do Mick Taylor. Em seu disco Shangrenade, ele explora a técnica em varias músicas, dente elas "Fish Walk", onde o tapping é aplicado de maneira simétrica e dissonante, influenciando músicos como Allan Holdsworth.

Recentemente apareceu o vídeo deste guitarrista italiano fazendo tapping em 1965. Ainda que eu não saiba nada sobre o músico, vale a pena postar aqui pra deixar registrado. Caso alguém tenha alguma informação sobre o músico, coloque nos comentários. Abraços!

segunda-feira, 20 de junho de 2011

TOP 5: Rock Progressivo Brasileiro

O título mais claro impossível. Citarei cinco bandas e seus respectivos álbuns que definiram o estilo brasileiro de se fazer rock progressivo. Sem delongas, vamos ao que interessa.

Os Mutantes - Tudo Foi Feito Pelo Sol
Fase emblemática e um tanto quanto polêmica dos Mutantes, tendo em vista que 2/3 do grupo (Rita Lee e Arnaldo Baptista) já não faziam mais parte da banda. Por sua vez, Sérgio Dias estava no auge de sua virtuosidade enquanto guitarrista e com uma voz bastante potente, qualidades essas expostas em composições complexas, bastante influenciadas pelo progressivo inglês. Muitos criticam o álbum dizendo que ele não apresenta a criatividade e carisma dos discos anteriores, outros sarcasticamente apelidaram a obra de "Tudo Que Já Foi Feito Pelo Yes", mas apesar das criticas, o álbum é uma das pedras fundamentais do progressivo brasileiro, tendo inclusive vendido muito bem para os padrões rockeiros da época. 

Som Nosso De Cada Dia - Snegs
O nome curioso, a capa cheia de cogumelos, a qualidade das composições e o desempenho dos músicos faz deste o melhor trabalho de rock progressivo já produzido no Brasil. Honestamente não consigo explicar de maneira técnica e fria as qualidades deste disco, talvez seja esse o grande mistério por traz dele, a inexplicável e maravilhosa sensação confortante e desafiadora de ouvir a clássica "Massavilha", a pesada (mesmo sem guitarra) "Bicho do Mato" e as transcendentais "Snegs de Biufrais" e "Sinal da Paranoia". Clássico absoluto.

O Terço - Criaturas da Noite
Sempre vi o Terço como uma mistura de Pink Floyd com o Clube da Esquina, ou seja, ao mesmo tempo que as músicas tinham viagens de guitarra proporcionadas pelo ótimo Sérgio Hinds, tinham também como característica as belas melodias mineiras, muito graças ao trabalho do ótimo compositor Flávio Venturini. As qualidades vocais do grupo ficam evidentes na longa e clássica "1974", música essa capaz de fazer muito fã de rock progressivo cair em lágrimas (já presenciei tal situação).

Terreno Baldio - Terreno Baldio
As três bandas citadas acima são famosas dos ouvintes atentos para o rock brasileiro, mas outra banda que apresenta o mesmo nível delas e não é tão comentada é o Terreno Baldio, conhecido também como "Gentle Giant brasileiro", o que é obviamente um exagero. A banda tinha em sua formação o figuraça e bastante conhecido da noite paulistana, João Kurk. Outro integrante que merece destaque é o guitarrista Mozart Mello, hoje um dos mais renomados professores de guitarra do Brasil. A banda tem feito shows esporadicamente, o suficiente para deixar os fãs de progressivo em estado de euforia. Note a semelhança do Terreno Baldio com o Gentle Giant na ótima "Despertar".

Cálix - Canções de Beurin
Como prova de que o rock progressivo brasileiro não foi uma simples febre do passado, apresento o Cálix, excelente banda de Minas Gerais formada em 1996 e ainda em atividade, com dois discos de estúdio e um DVD lançado. A música deles tem solos que remetem ao Pink Floyd, passagens com cara de Jethro Tull e pitadas de originalidade.

Vejam os vídeos, façam criticas e recomendem bandas nos comentários. Vamos compartilhar e divulgar o que conhecemos. 

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Indecente, humorado e bocudo, mas sem perder o lirismo

A música popular, independente da época e região, sempre abusou de frases de duplo sentido, ironias, obscenidades, palavrões e outros artifícios naturais de expressão. Entretanto, o que era pra ser engraçado, atrevido e espontâneo, virou mera baixaria gratuita.

Quero deixar claro que digo isso sem qualquer vestígio de moralismo. O meu problema é fundamentalmente estético. Não acho que fatores sociais justificam estereótipos meramente mercadológicos em detrimento da arte em si.

Pensado nisso, venho aqui exemplificar artistas que fazem/fizeram uso deste tipo de linguagem sem soar rasteiro. Mesmo que algumas músicas tenham palavras ditas de baixo calão, elas são usadas com naturalidade, somando ao vocabulário dito formal. Portanto, abandonem qualquer tipo de hipocrisia e curtam as músicas abaixo.

"Boceta de Rapé"
O Brasil sempre teve o duplo sentido dentro de sua música. É bom lembrar que dentre as primeiras gravações feitas em terras nacionais, ainda nos tempos da Casa Edison, estava a curiosa "Boceta de Rapé".

Camisa de Vênus
Já vi o João Gordo dizendo que ficou espantando quando ouviu um disco do Camisa de Vênus e percebeu os inúmeros palavrões. E embora fazendo uso do baixo calão, ninguém pode acusar o Marcelo Nova de não ser um grande letrista.

Raimundos e Zenilton
Ainda que quase um século depois da "Boceta de Rapé", os Raimundos foram um dos principais responsáveis por naturalizar o uso de duplo sentido, palavrão e gírias na música brasileira. Esse lirismo coloquial fica ainda mais genuíno e hilariante através da participação do Zenilton. Escute a excepcional "Cajueiro" e perceba.

Mamonas Assassinas
Na cola do êxito comercial dos Raimundos surgiu os Mamonas Assassinas. Colocando o humor como prioridade, eles criaram boas músicas coerentes com a proposta inicial.

"Weird AI" Yankovic
Obviamente, a malícia não é qualidade exclusiva dos brasileiros na hora de compor. O rei das paródias "Weird AI" Yankovic abusa de expressões coloquiais humoradas para fazer versões de clássicos da música pop. Dentre elas está a engraçada "Fat", paródia feita para "Bad" do Michael Jackson. 

Beastie Boys
O hip hop sempre foi um gênero polêmico no que diz respeito as letras. Mas a coisa ficou mais séria quando três branquelos gravaram um disco de rap falando sobre baboseiras juvenis. Pior ainda foi a reação das pessoas quando o disco foi parar no 1º lugar da Billboard, feito este inédito na época para o estilo. Mas apesar das letras serem "idiotas" (no bom sentido), as músicas eram excelentes, vide a fantástica "(You Gotta) Fight For Your Right (to Party)".
 

N.W.A. - Fuck Tha Police
Nada melhor que um sonoro "foda-se" diante das injustiças sociais sofrida pelos negros. Não preciso nem dizer que o FBI não gostou nenhum um pouco, né. Clássico do hip hop!

The Doors - Light My Fire
Hoje é corriqueiro na música falar sobre ficar "doidão", mas quando os Doors sugeriu isso em em "Light My Fire" ao vivo para todo os EUA, eles foram banidos do Ed Sullivan Show, um dos principais programas televisivos da época.

Prince - Darling Nikki
Prince não poupou explicites ao escrever "Darling Nikki". Ao que consta, a letra revoltou diversas mães representantes da "moral e bons costumes".

Cannibal Corpse - Hammer Smashed Face
Para finalizar, um clássico do metal extremo que fala por si só. Motivos não faltam para estar aqui. Sensacional.

Deixem nos comentários outras músicas desbocadas.

terça-feira, 14 de junho de 2011

TEM QUE OUVIR: The Smiths - The Queen Is Dead (1986)

É difícil encontrar quem negue que The Queen Is Dead (1986) é a obra-prima do Smiths. Ainda que a banda já tivesse conquistado público e crítica com os discos anteriores, vide o ótimo Meat Is Murder (1985), foi neste terceiro trabalho que eles alcançaram o mais alto patamar, tanto no que diz respeito ao sucesso comercial, quanto na qualidade das composições e interpretações.


O álbum começa assombrosamente com "The Queen Is Dead", um ataque frontal (e sofisticado) a família real inglesa. A influência do pós-punk e Velvet Undergroud fica bastante evidente, assim como a ótima linha de baixo de Andy Rourke e a bateria tribal de Mike Joyce.

"Frankly, Mr. Shankly" a primeira audição parece um quase "reggae" inofensivo, mas retrata o problema da banda dentro do selo que lançava seus discos, sendo Geoff Travis (dono da Rough Trade) o tal do Shankly. 

Uma das melhores faixas do disco é a espetacular "Bigmouth Strikes Again", com sua letra perturbadora e todas as qualidades do ótimo guitarrista Johnny Marr sendo evidenciadas, vide a levada contagiante de violão, a inteligente abordagem harmônica e o timbre cristalino.

Grandes sucessos do grupo preenchem a obra, vide a boa "The Boy With The Thorn In His Side", que contém uma interpretação emblemática de Morrissey, principalmente no que diz respeito ao seu timbre peculiar, vibratos e divisões rítmicas/silábicas inusitadas. 

Outro hit é a linda "There Is a Light That Never Goes Out", dona de um dos melhores refrões da música pop, baixo imponente e arranjo majestoso. Clássico!

As qualidades de letrista do Morrissey se estendem na impecável "I Know It's Over", na depressiva "Never Had No One Ever" e na agitada "Cemetry Gates". Todas introspectivas, cerebrais e confessionais.

O clima rockabilly aparece na divertida "Vicar In A Tutu". Já a intrigante "Some Girls Are Bigger Than Others" é um bom exemplo da visão de Johnny Marr ao abordar harmonias aparentemente simples, mas pontualmente sofisticadas. Total jingle-jangle (ou jangle pop).

The Queen Is Dead não é superestimado. O álbum merece a devida atenção que há décadas a crítica vem apontando. Através dele é possível entender não só o pós-punk e o indie rock, mas todo o rock inglês. Influência direita do Stone Roses ao Arctic Monkeys.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Música ruim é mais um triunfo do capitalismo

Você já parou para pensar que estamos presenciando um dos momentos mais caretas da história da humanidade? E que os valores pregados não condizem com o mundo miserável, desigual, violento e sujo que vivemos?

Mas por que estou falando tudo isso? Você deve ter ouvido a tal A Banda Mais Bonita da Cidade, né? Pois então, o clima festivo de plástico que domina o vídeo feito para a horrorosa música "Oração", além de ser um plágio descarado do clipe "There's An Arc" do Hey Rosetta, é também a última grande prova de quão deprimente são os tempos atuais.

O público responsável pela aprovação desta falsa bela música é em grande maioria universitário, que deveria ser o grupo mais intelectual e ativo de uma sociedade.

A juventude deveria ser mais critica e idealizadora de grandes manifestações artísticas. A juventude tem que estar na vanguarda intelectual. Todavia, nos últimos anos ela deixou de produtora e passou a aceitar de braços abertos o que lhe é oferecido, seja forró universitário, sertanejo universitário e bandas miseravelmente melodramáticas.

Não que eu seja grande bosta, mas me espanta ver como minha geração consome tanta porcaria. Luan Santana, Claudia Leite, Restart, Sorriso Maroto e Banda Mais Bonita da Cidade, não se engane, é tudo farinha do mesmo saco. Não se trata nem de gosto musical, nem de moralismo, mas de confronto. Não estou pedindo por pessoas politicamente engajadas, prontas para resolver qualquer problema. O que desejo é um pouco mais de atitude e menos o comportamento passivo e complacente com o corporativismo artístico.

Tenho medo dos frutos que tudo isso vai gerar. Provavelmente uma geração que baixa a cabeça para um "cala a boca". Por isso, tome cuidado com o que você consome, não se deixe levar pela ideia de que "é só música, é só diversão, não tem problema, é assim mesmo", "não gostou, faz melhor" e "esse é meu gosto musical, a música é linda". A mais crua realidade é que estamos em um processo de idiotização em massa e, espantosamente, a maioria tem passado com méritos no teste final. Eis mais um triunfo do capitalismo.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

TEM QUE OUVIR: João Gilberto - Chega de Saudade (1959)

Hoje é aniversário do excêntrico e genial João Gilberto, que chega aos seus 80 anos.

O baiano nascido em Juazeiro foi responsável por difundir a bossa nova, estilo que há mais de 50 anos corre pelo mundo levando a bandeira do Brasil e, curiosamente, servindo de trilha sonora para a cidade do Rio de Janeiro.

É verdade que o famoso ritmo sincopado do estilo já havia sido aplicado no acordeon anteriormente pelo João Donato, mas foi João Gilberto o responsável por decodificar a "batida da bossa nova" e somar a ela a suavidade do seu canto influenciado pelo Mario Reis.

É verdade também que a bossa nova não representa o verdadeiro Brasil, miserável por natureza e condicionado a estupidez, mas daí a usar este argumento para menosprezar as composições de Tom Jobim e Vinícius de Moraes seria assinar o atestado de ignorância.

João Gilberto além do talento musical apurado, ainda mantém o status de lenda temperamental. Muito disso por não dar entrevistas, espinafrar técnicos de som e viver recluso em seu apartamento. Outro motivo que lhe rendeu a fama de "artista difícil" é o de não tolerar plateias barulhentas, fato que o acompanha desde a juventude, quando mesmo no anonimato e com dificuldades financeiras, se negava a tocar para pessoas que não respeitassem a sua música.

O álbum responsável por sacramentar a importância do João Gilberto na música brasileira é o clássico Chega de Saudade (1959), que mostrou para os jovens daquele período - do Marcos Valle ao Caetano Veloso - que havia uma nova alternativa aos cantores da Rádio Nacional que seus pais ouviam. Eles agora tinham sua própria música jovem, brasileira e rica.


O disco abre com a canção "Chega de Saudade", música que definiu a bossa nova enquanto uma linguagem musical. A famosa batida do violão de João Gilberto somada ao arranjo espetacular de Tom Jobim, serve de cama para que a letra de Vinícius de Moraes ganhe voz numa melodia riquíssima. Para completar o time de estrelas, este clássico tem ainda a levada contagiante/suave do lendário baterista Milton Banana. 

Na sequência, toda a ingenuidade igualmente amada e odiada da bossa nova se faz valer na bela "Lobo Bobo". 

Tom Jobim voltar a deixar sua marca no belo arranjo de "Brigas, Nunca Mais", assim como no piano da alucinante "Ho-Ba-La-La". 

Milton Banana justifica o porque de ser um dos mais respeitados bateristas do Brasil em "Saudade Fez Um Samba", onde a vassourinha na caixa soa contagiante, embalando a harmonia num ritmo espetacular. Já João Gilberto mostra toda a sua afinação e influência do cool jazz ao cantar a bela melodia de "Maria Ninguém".

"Desafinado" é um clássico da bossa nova proporcional a faixa que leva o nome do disco. A gravação presente neste álbum é considerada por muitos a versão definitiva da canção de Newton Mendonça e Tom Jobim.

Nos sambas "Rosa Morena" e "Morena Boca de Ouro", João Gilberto presta homenagem a duas de suas maiores influências, respectivamente os lendários Dorival Caymmi e Ary Barroso. 

A curtinha "Bim Bom" é das poucas faixas compostas pelo próprio João, revelando seu lado aparentemente simples, descontraído e minimalista, ainda que ritmicamente complexo. Já aos "Aos Pés da Cruz" traz uma letra elaborada cantada em cima de uma harmonia que sintetiza a beleza da bossa nova. Fechando o álbum, Milton Banana e João esbanjam um groove contagiante em "É Luxo Só".

Além da qualidade das composições, outro fato interessante do disco é qualidade da gravação, tendo em vista que essa obra foi registrada há mais de 50 anos. 

João Gilberto está vivo e, aparentemente, começará em breve uma série de shows pelo Brasil, comemorando seus 80 anos. Enquanto isso não acontece, só nos resta ouvir este verdadeiro patrimônio cultural da humanidades.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

TEM QUE OUVIR: Slayer - Reign In Blood (1986)

Escolher um disco definitivo do Slayer é relativamente fácil. Apesar da importância do Show No Mercy (1983) e da excelência dos espetaculares Seasons In The Abyss (1990) e God Hates Us All (2001), Reign In Blood (1986) é o clássico incontestável. O álbum ainda hoje é uma aula de como compor, tocar e produzir thrash metal.


"Angel Of Death" abre o disco. Apesar de já ter escutado a canção dezenas de vezes, ainda sinto elevado grau de perturbação quando ouço o primeiro acorde. Digo isso porque, além da faixa ser de violência musical incomum para a época, a produção dela é nítida. Mérito do lendário Rick Rubin. A letra trata de assuntos relacionados aos campos de concentração nazistas, mais precisamente o de Auschwitz. Prato cheio para quem gosta de problematizar o heavy metal. Não faltou acusações contra a banda.

Honestamente, acho desnecessário comentar faixa por faixa, tendo em vista que o que ouvimos a seguir é uma repetição da porradaria avassaladora do Slayer, outrora assustadora e polêmica, hoje de êxito artístico inquestionável.

Da segunda faixa ("Piece By Piece") até a nona ("Postmortem"), o que temos é a dupla Kerry King e Jeff Hanneman - principais compositores da banda - disparando um riff mais desgraçado que o outro. O baterista Dave Lombardo acompanha tudo isso com viradas alucinantes e bumbos numa velocidade inovadora. Com isso, Lombardo fez história e tornou-se um dos bateristas mais influentes e respeitados do metal.

O baixo simples e eficaz de Tom Araya fica em segundo plano quando ele começa a berrar alucinadamente letras que falam sobre guerras, religiões, assassinatos, distúrbios mentais e outros temas que aterrorizaram as famílias mais conservadoras. Uma música que representa muito bem todas essas características da banda é a clássica "Raining Blood", que contém um dos riffs mais famosos da história do metal, encerrando o disco impecavelmente.

Mesmo que o thrash metal não seja o seu estilo predileto, a audição de Reign In Blood é recomendável, até porque este disco de apenas 30 minutos não entrega um peso caricato, mas sim o que de mais insano e genuíno foi produzido até hoje. Isso tudo sem apelar para grandes avanços tecnológico. O peso vem de seres humanos, que tocam seus instrumentos com uma ferocidade absurda. A brutalidade musical prevalece e os apreciadores da música extrema agradecem.

terça-feira, 7 de junho de 2011

TOP 5: A desconcertante sonoridade do rock oitentista

Muitos fãs tradicionais de rock dizem que a década de 1980 foi a década perdida. Bandas de rock progressivo ficaram pasteurizadas, o hard rock tornou-se mais visual que musical, o pop do Michael Jackson monopolizou a industria, grandes bandas dos anos 70 encerraram as atividades (Led Zeppelin, por exemplo) e ícones morreram (John Lennon, por exemplo).

Mas a verdade é que o surgimento do punk e da disco music no final da década de 1970 direcionou o rock para novos caminhos. Dai surgiu bandas que tinham a atitude punk, mas com arranjos elaborados.

Bandas de new wave e pós-punk hoje praticamente não existem (ou estão fora do grande holofote), mas venho aqui lembrar de grandes grupos que fizeram parte e ditaram a sonoridade de uma década vista com maus olhos.

Obs: Evitarei falar de bandas muito óbvias, como o The Cure, Sonic Youth, New Order, Duran Duran, U2, The Smiths, R.E.M., Pixies e Talking Heads. Mas também não revelarei nenhuma banda obscura, portanto, são apenas bandas que valem relembrar.

01 - Killing Joke
Para muitos, o rock oitentista foi muito "dançante". Tal qualidade (eu vejo desta forma) é muito bem representado pelo Killing Joke, onde as levadas de bateria são capazes de contagiar o ouvinte sem o menor esforço. Apesar desta característica, o som do grupo é bastante encorpado, servindo até mesmo de influência para o peso de bandas como o Nirvana. Escute "Eighties" e comprove isso (qualquer semelhança com "Come As You Are" não é mera coincidência). Vale se atentar as letras do enlouquecido Jaz Coleman.

02 - Missing Persons
Missing Persons foi uma banda de new wave formada por músicos da banda do Frank Zappa, dentre eles o espetacular baterista Terry Bozzio e o guitarrista Warren Cuccurullo (que tocou também com o Duran Duran). Os vocais do grupo ficaram a cargo da frenética esposa do baterista, a Dale Bozzio. Sua voz em alguns momentos é bem influenciado pela sonoridade hard rock. Já o instrumental é uma mistura de teclados com timbres típicos do anos 80, guitarras cacofônicas/minimalista e levadas perturbadoras de bateria. Vale notar que o timbre da bateria é bastante orgânico se comparado com as demais bandas da época. 

03 - Bauhaus
De todas as bandas ditas góticas, o Bauhaus é a que eu mais gosto. Surgida da leva pós-punk, a sonoridade do grupo era muito mais mórbida e obscura que as demais. Os timbres eletrônicos, a postura do Peter Murphy e as guitarras berrantes do ótimo Daniel Ash, ainda hoje servem de referência para a compreensão de muitos movimentos que surgiram no rock após os anos 80. Confira o peso espetacular da impactante "Double Dare".

04 - Gang Of Four
O Gang Of Four mescla a porradaria punk com uma dose de insanidade proporcionada pelo esporro barulhento do ótimo guitarrista Andy Gill. Somando isso a figura entorpecida do vocalista Jon King e aos grooves de baixo espetaculares do Dave Allen, o grupo ganhou notoriedade entre as bandas indies surgidas nas ultimas décadas. Vale lembrar que eles também são influência para muito do rock brasileiro da década de 80 (Ira!, por exemplo).

05 - Einstürzende Neubauten
Grupo absurdamente singular. Influenciou muito do que veio a ser conhecido como rock industrial. A força braçal das músicas beira o absurdo. O Blixa Bargeld é um dos maiores criadores da sua geração.

Um dos intuitos deste post é tentar desmistificar a fama de rock pasteurizado dos anos 80, fama essa promovida por estações de rádio como KISS FM, que insiste em sobrecarregar sua programação com algumas chatices oitentistas. A verdade é que o rock em qualquer década sempre foi (e sempre será) muito interessante, cabe ao ouvinte não se guiar por nenhuma grande mídia e usar as ferramentas certas para ouvir música.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

TEM QUE OUVIR: Alice Cooper - School's Out (1972)

Alice Cooper não é apenas um cantor, é um entertainer. Seus shows mais parecem um teatro e sua música muitas vezes fica em segundo plano na atenção do público. Mas a prova de que a tia Alice tem grandes canções é a quantidade de clássicos dentro de sua discografia, sendo o período que vai de 1971 à 1974 - quando respondia pela Alice Cooper Group -, seu melhor momento. Mas qual disco desta fase devo destacar? Fico com aquele que possivelmente seja o seu trabalho mais popular, o ótimo School's Out de 1972.


Logo de cara temos o petardo alucinante de "School's Out". O riff de guitarra da introdução somado a linha de baixo ultra entorpecida, servem de cama perfeita para Alice Cooper despejar uma letra juvenil poderosa. Já o refrão - dono de levada tribal de bateria - cresce assim que vozes de crianças são escutadas berrando "no more teacher's dirty looks". Um clássico! Com uma abertura tão bombástica em um disco que traz na capa uma mesa escolar rabiscada, Alice Cooper ganhou a atenção do público jovem.

"Luney Tune" evidencia um Alice Cooper com voz potente numa canção paranoica, dona de arranjo orquestral climático - mérito do produtor Bob Ezrin -, violões melódicos e uma guitarra carregada de fuzz. Por sua vez, "Gutter Cat vs. The Jets" é um rock básico, com linha de baixo borbulhante do Dennis Dunaway, assim como os teclados insanos tocados pelo Michael Bruce.

"Street Fight" é uma faixa curtinha que agrega ao disco a atmosfera teatral da banda no palco. Além disso, ela nos leva para a cinematográfica "Blue Turk" (o clima e o sax da música lembram o tema do Pantera Cor-de-Rosa), uma canção melodiosa que comprova que a banda do Alice continha integrantes acima da média.

"My Stars" contém momentos inspirados do subestimado guitarrista Glen Buxton. O piano e a letra deixam a música doentia, tenebrosa, progressiva e extremamente melodiosa.

"Public Animal #9" é um rockão cheio de groove, com backing vocals melodiosos se contrapondo a voz potente e rasgada do Alice Cooper. Já "Alma Mater" é uma memorável balada. Seu final apoteótico emenda com o começo de "Grande Finale", faixa instrumental cheia de influências da soul music. Ela fecha o álbum com chave de ouro, dando acabamento cinematográfico ao disco, tamanha é a quantidade de sensações que é capaz de provocar.